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Há 4 pontos em «Cristo que Passa» cujo tema é Esperança → otimismo cristão .

Entre os dons do Espírito Santo, eu diria que há um de que todos nós, cristãos, temos especial necessidade: o dom da Sabedoria, que, fazendo-nos conhecer a Deus e tomar-Lhe o sabor, nos coloca em condições de poder julgar com verdade as situações e as coisas da vida presente. Se fôssemos consequentes com a nossa fé, quando olhássemos à nossa volta e contemplássemos o espectáculo da História e do Mundo, não poderíamos deixar de sentir crescer nos nossos corações os mesmos sentimentos que animaram o de Jesus Cristo: ao ver aquelas multidões, compadeceu-se delas, porque estavam maltratadas e fatigadas e como ovelhas sem pastor.

Não é que o cristão não veja todo o bem que há na Humanidade, não aprecie as alegrias puras, não participe dos anseios e dos ideais terrenos. Pelo contrário, sente tudo isso desde o mais recôndito da alma e compartilha-o e vive-o com especial intensidade, pois conhece melhor do que ninguém os arcanos do espírito humano.

A fé cristã não nos torna pusilânimes nem cerceia os impulsos nobres da alma, pois é ela que os engrandece, ao revelar o seu verdadeiro e mais autêntico sentido: não estamos destinados a uma felicidade qualquer, porque fomos chamados à intimidade divina, a conhecer e amar Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo e, na Trindade e na Unidade de Deus, todos os anjos e todos os homens.

Essa é a grande ousadia da fé cristã: proclamar o valor e a dignidade da natureza humana e afirmar que, mediante a graça que nos eleva à ordem sobrenatural, fomos criados para alcançar a dignidade de filhos de Deus. Ousadia de certo incrível, se não se baseasse no desígnio salvador de Deus Pai e não houvesse sido confirmada pelo Sangue de Cristo e reafirmada e tornada possível pela acção constante do Espírito Santo.

Temos de viver de Fé, crescer na Fé, até poder dizer de cada um de nós, de cada cristão, o que há muitos séculos escreveu um dos grandes Doutores da Igreja Oriental: Da mesma maneira que os corpos transparentes e límpidos, quando recebem os raios luminosos, se tornam resplandecentes e irradiam brilho, assim as almas que são conduzidas e iluminadas pelo Espírito Santo se tornam também espirituais e levam às outras a luz da graça. Do Espírito Santo procede o conhecimento das coisas futuras, a inteligência dos mistérios, a compreensão das verdades ocultas, a distribuição dos dons, a cidadania celeste, a conversação com os Anjos. D'Ele, a alegria que nunca termina, a perseverança em Deus, a semelhança com Deus e - a coisa mais sublime que pode ser pensada - a transformação em Deus

A consciência da grandeza da dignidade humana - de um modo eminente e inefável, pois fomos, pela acção da graça, constituídos filhos de Deus - é no cristão uma só coisa com a humildade, visto que não são as nossas forças que nos salvam e nos dão a vida, mas o favor divino. É uma verdade que não se pode esquecer, porque senão pervertia-se o nosso endeusamento, convertendo-se em presunção, em soberba e, mais cedo ou mais tarde, em ruína espiritual perante a experiência da nossa fraqueza e miséria.

Atrever-me-ei a dizer que sou santo? - perguntava a si mesmo Santo Agostinho - Se dissesse santo como santificador e não necessitado de ninguém que me santificasse, seria soberbo e mentiroso. Mas, se entendo por santo o santificado, segundo aquilo que se lê no Levítico: sede santos, porque Eu, Deus, sou santo, então também o corpo de Cristo, até ao último homem situado nos confins da Terra, poderá dizer ousadamente, unido à sua Cabeça e a ela subordinado: sou santo

Amemos a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade; escutemos na intimidade do nosso ser as moções divinas - alentos, censuras - ; caminhemos sobre a Terra dentro da luz derramada na nossa alma; e o Deus da esperança nos encherá de todas as formas de paz, para que essa esperança vá crescendo em nós cada vez mais, pela virtude do Espírito Santo.

O optimismo cristão

Alguma vez poderá surgir a tentação de pensar que tudo isto é tão belo como um sonho irrealizável. Falei-vos de renovar a fé e a esperança; permanecei firmes, com a certeza absoluta de que as nossas aspirações serão ultrapassadas pelas maravilhas de Deus. Mas torna-se indispensável que nos apoiemosverdadeiramente na virtude cristã da esperança.

Não nos acostumemos aos milagres que se operam perante nós: ao admirável portento que é o Senhor descer todos os dias às mãos do sacerdote. Jesus quer que estejamos despertos, para que nos convençamos da grandeza do seu poder, e para que ouçamos novamente a sua promessa: venite post me, et faciam vos fieri piscatores hominum, se Me seguirdes, far-vos-ei pescadores de homens; sereis eficazes e atraireis as almas a Deus. Devemos, portanto, confiar nessas palavras do Senhor: meter-se na barca, pegar nos remos, içar as velas e lançar-nos a esse mar do mundo que Cristo nos deixa em herança. Duc in altum et laxate rectia vestra in capturam! : fazei-vos ao largo e lançai as vossas redes para pescar.

Este zelo apostólico que Cristo infundiu no nosso coração não se deve esgotar - extinguir - por uma falsa humildade. Se é verdade que arrastamos connosco as nossas misérias, também é verdade que o Senhor conta com os nossos erros. Não escapa ao seu olhar misericordioso que nós, os homens, somos criaturas com limitações, com fraquezas, com imperfeições, inclinadas ao pecado. Por isso, manda-nos lutar, reconhecer os nossos defeitos; não para nos acobardarmos, mas para nos arrependermos e fomentarmos o desejo de sermos melhores.

Aliás, temos de lembrar-nos sempre de que somos apenas instrumentos: Que é, pois, ApoIo? e que é Paulo? Ministros daquele em quem vás crestes, segundo o dom que o Senhor deu a cada um. Eu plantei, Apolo regou; mas Deus é que deu o crescimento. A doutrina, a mensagem que temos de difundir, tem uma fecundidade própria e infinita, que não é nossa, mas de Cristo. É o próprio Deus quem está empenhado em realizar a obra salvadora, em redimir o, mundo.

Tenhamos, pois, Fé, sem permitir que o desalento nos domine; sem nos determos em cálculos meramente humanos. Para superar os obstáculos, há que começar a trabalhar, metendo-se em cheio nessa tarefa, de maneira que o nosso próprio esforço nos leve a abrir novos caminhos. Perante qualquer dificuldade, o remédio é este: santidade pessoal, entrega ao Senhor.

Ser santos é viver tal como o nosso Pai do Céu dispôs que vivêssemos. Dir-me-eis que é difícil. Sim, o ideal é muito elevado. Mas ao mesmo tempo é fácil: está ao alcance da mão. Quando uma pessoa adoece, nem sempre se consegue encontrar o remédio adequado para a tratar. Mas no plano sobrenatural não acontece assim. O remédio está sempre perto de nós: é Jesus Cristo, presente na Sagrada Eucaristia, que também nos dá a sua graça nos outros Sacramentos que instituiu.

Repitamos com a palavra e com as obras: Senhor, confio em Ti, basta-me a tua providência ordinária, a tua ajuda de cada dia. Não temos por que pedir a Deus grandes milagres. Temos de lhe suplicar, pelo contrário, que aumente a nossa fé, que ilumine a nossa inteligência, que fortaleça a nossa vontade. Jesus está sempre junto de nós e permanece fiel.

Desde o começo da minha pregação, preveni-vos contra um falso endeusamento. Não te assustes ao veres-te tal como és: assim, feito de barro. Não te preocupes. Porque, tu e eu somos filhos de Deus, - este é o endeusamento bom - escolhidos desde a eternidade, com uma vocação divina: escolheu-nos o Pai, por Jesus Cristo, antes da criação do mando, para que sejamos santos diante dele. Nós, que somos especialmente de Deus, seus instrumentos apesar da nossa pobre miséria pessoal, seremos eficazes se não perdermos o conhecimento da nossa fraqueza. As tentações dão-nos a dimensão da nosso própria fraqueza.

Se sentimos desalento ao experimentar - talvez de um modo particularmente vivo - a nossa mesquinhez, é o momento de nos abandonarmos por completo, com docilidade, nas mãos de Deus. Conta-se que, certo dia, um mendigo saiu ao encontro de Alexandre Magno, pedindo uma esmola. Alexandre parou e ordenou que o fizessem senhor de cinco cidades. O pobre, confundido e atordoado, exclamou: eu não pedia tanto! E Alexandre respondeu: tu pediste como quem és; eu dou-te como quem sou.

Mesmo nos momentos em que percebemos mais profundamente a nossa limitação, podemos e devemos olhar para Deus Pai, Deus Filho, Deus Espírito Santo, sabendo-nos participantes da vida divina. Nunca existe razão suficiente para voltarmos atrás: o Senhor está ao nosso lado. Temos que ser fiéis, leais, encarar as nossas obrigações, encontrando em Jesus o amor e o estímulo para compreender os erros dos outros e superar os nossos próprios erros. Assim, todos esses desalentos - os teus, os meus, os de todos os homens - servem também de suporte ao reino de Cristo.

Reconheçamos as nossas fraquezas, mas confessemos o poder de Deus. O optimismo, a alegria, a convicção firme de que o Senhor quer servir-se de nós têm de informar a vida cristã. Se nos sentirmos parte dessa Igreja Santa, se nos considerarmos sustentados pela rocha firme de Pedro e pela acção do Espírito Santo, decidir-nos-emos a cumprir o pequeno dever de cada instante: semear todos os dias um pouco. E a colheita fará transbordar os celeiros.

A alegria cristã

Recolhamos de novo o tema que a Igreja nos propõe: Maria subiu aos céus em corpo e alma: os anjos rejubilam! Penso também no júbilo de S. José, seu Esposo castíssimo, que a aguardava no paraíso. Mas voltemos à Terra. A fé confirma-nos que aqui em baixo, na vida presente, estamos em tempo de viagem, pelo que não faltarão os sacrifícios, a dor e as privações. Todavia, a alegria há-de ser sempre o contraponto do caminho.

Servi ao Senhor com alegria. Não há outro modo de servi-Lo,. Deus ama quem dá com alegria, quem se entrega totalmente num sacrifício gostoso porque não há motivo algum que justifique o desânimo!

Talvez julgueis que este optimismo é excessivo, porque todos os homens conhecem as suas insuficiências e os seus fracassos, experimentam o sofrimento, o cansaço, a ingratidão, talvez até o ódio. Nós, os cristãos, se somos iguais aos outros, como poderemos estar livres dessas constantes da condição humaniza?

Seria ingénuo negar a reiterada presença da dor e do desânimo, da tristeza e da solidão, durante a nossa peregrinação por esta terra. Aprendemos pela fé com segurança que tudo isso não é produto do acaso e que o destino da criatura não é caminhar para a aniquilação dos seus desejos de felicidade. A fé ensina-nos que tudo tem um sentido divino, pois esta é uma característica intrínseca e própria do caminho que nos leva à casa do Pai. Esta maneira sobrenatural de compreender a existência terrena do cristão, não simplifica a complexidade humana, mas assegura ao homem que essa complexidade pode ser penetrada pelo nervo do amor de Deus, pelo cabo forte e indestrutível, que liga a vida na Terra com a vida definitiva na Pátria.

A festa da Assunção de Nossa Senhora apresenta-nos a realidade dessa feliz esperança. Somos ainda peregrinos, mas a Nossa Mãe precedeu-nos e aponta-nos já o termo do caminho. Repete-nos que é possível lá chegar e que, se formos fiéis, lá chegaremos, pois a Santíssima Virgem não é só nosso exemplo, mas também auxílio dos cristãos. E perante a nossa petição - Monstra te esse Matrem mostra que és Mãe - não pode nem quer negar-se a cuidar dos seus filhos com solicitude maternal.