Lista de pontos

Há 4 pontos em «Cristo que Passa» cujo tema é Esperança → e vida cristã.

O trigo e o joio

Tracei-vos, com a doutrina de Cristo, não com as minhas ideias, um caminho ideal para o cristão. Concordais que é elevado, sublime, atractivo. Mas talvez nos. interroguemos: será possível viver assim na sociedade de hoje?

É certo que o Senhor nos chamou em momentos em que muito se fala de paz e não há paz: nem nas almas, nem nas instituições, nem na vida social, nem entre os povos. Fala-se continuamente de igualdade e de democracia e abundam as castas: fechadas, impenetráveis. Chamou-nos num tempo em que se clama pela compreensão e a compreensão brilha pela sua ausência, inclusivamente entre pessoas que agem de boa fé e querem praticar a caridade, porque - não esqueçais - a caridade, mais do que em dar, está em compreender.

Atravessamos uma época em que os fanáticos e os intransigentes - incapazes de admitir as razões dos outros - se põem a salvo, tachando de violentos e agressivos os que são as suas vitimas. Chamou-nos, enfim, quando se ouve tagarelar muito sobre unidade e talvez seja difícil conceber que possa tolerar-se maior desunião entre os próprios católicos, para não falar já dos homens em geral.

Eu nunca faço considerações políticas, porque esse não é o meu ofício. Para descrever sacerdotalmente a situação do mundo actual, é suficiente que pensemos de novo numa parábola do Senhor: a do trigo e do joio. O reino dos céus é semelhante a um homem que semeou boa semente no seu campo. Porém, enquanto os trabalhadores dormiam, veio o seu inimigo, e semeou joio no meio do trigo, e foi-se embora. Está claro: o campo é fértil e a semente é boa; o Senhor do campo lançou às mãos cheias a semente no momento propicio e com arte consumada; além disso, preparou toda uma vigilância para proteger a recente sementeira. Se depois apareceu o joio, é porque não houve correspondência, já que os homens - os cristãos especialmente - adormeceram e permitiram que o inimigo se aproximasse.

Quando os servidores irresponsáveis perguntam ao Senhor porque cresceu o joio no seu campo, a explicação salta aos olhos: inimicus homo hoc fecit, foi o inimigo! Nós, os cristãos, que devíamos estar vigilantes para que as coisas boas, postas pelo Criador no mundo, se desenvolvessem ao serviço da verdade e do bem, adormecemos - triste preguiça, esse sono! -, enquanto o inimigo e todos os que o servem se moviam sem descanso. Bem vedes como cresceu o joio: que sementeira tão abundante espalhada por todos os sítios!

Não tenho vocação de profeta de desgraças. Não desejo com as minhas palavras apresentar-vos um panorama desolador, sem esperança. Não pretendo queixar-me destes tempos em que vivemos pela providência do Senhor. Amamos esta nossa época, porque é o âmbito em que temos de alcançar a nossa santificação pessoal. Não admitimos nostalgias ingénuas e estéreis; o mundo nunca esteve melhor. Desde sempre, desde os princípios da Igreja, quando mal se acabava de ouvir a pregação dos primeiros doze, já surgiram violentas perseguições, começaram as heresias, propalou-se a mentira e desencadeou-se o ódio.

Mas não é lógico negar que o mal parece ter prosperado. Dentro de todo este campo de Deus, que é a Terra, herança de Cristo, irrompeu o joio: Não apenas joio, mas abundância de joio! Não podemos deixar enganar-nos pelo mito do progresso perene e irreversível. O progresso rectamente ordenado é bom e Deus quere-o. Contudo, tem-se mais em conta o outro falso progresso que cega os olhos a tanta gente, porque com frequência não percebe que a Humanidade, nalguns dos seus passos, volta atrás e perde o que tinha conquistado antes.

O Senhor - repito - deu-nos o mundo por herança. Temos de ter a alma e a inteligência despertas; temos de ser realistas, sem derrotismos. Só uma consciência cauterizada, só a insensibilidade produzida pela rotina, só o estouvamento frívolo podem permitir que se contemple o mundo sem ver o mal, a ofensa a Deus, o dano por vezes irreparável para as almas. É preciso sermos optimistas, mas com um optimismo que nasça da fé no poder de Deus - Deus não perde batalhas - com um optimismo que não proceda da satisfação humana, duma complacência néscia e presunçosa.

Permiti-me narrar um facto da minha vida pessoal, ocorrido já há muitos anos. Certo dia, um amigo de bom coração, mas que não tinha fé, disse-me, indicando um mapa-mundi: - Ora veja, de norte a sul e de leste a oeste. - Que queres que eu veja? - O fracasso de Cristo. Tantos séculos a procurar meter na vida dos homens a sua doutrina, e veja os resultados.. Num primeiro momento, enchi-me de tristeza: é uma grande dor, efectivamente, considerar que são muitos os que ainda não conhecem o Senhor e que, entre aqueles que O conhecem, são muitos também os que vivem como se O não conhecessem.

Mas essa impressão durou apenas um instante, para logo dar lugar ao amor e à acção de graças, porque Jesus quis que cada um dos homens fosse cooperador livre da sua obra redentora. Cristo não fracassou: a sua doutrina está continuamente a fecundar o Mundo. A redenção realizada por Ele é suficiente e superabundante.

Deus não quer escravos, mas sim filhos e, portanto, respeita a nossa liberdade. A salvação continua e nós participamos dela: é vontade de Cristo que - segundo as palavras fortes de S. Paulo - cumpramos na nossa carne, na nossa vida, o que falta à sua Paixão, pro Corpore eius, quod est Ecclesia, em benefício do seu corpo, que é a Igreja.

Vale a pena jogar a vida, entregar-se por inteiro, para corresponder ao amor e à confiança que Deus deposita em nós. Vale a pena, acima de tudo, que nos decidamos a tomar a sério a nossa fé cristã. Quando recitamos o Credo, professamos crer em Deus Pai Todo-Poderoso, em seu Filho Jesus Cristo que morreu e foi ressuscitado, no Espírito Santo, Senhor que dá a vida. Confessamos que a Igreja una, santa, católica e apostólica, é o corpo de Cristo, animado pelo Espírito Santo. Alegramo-nos com a remissão dos nossos pecados e com a esperança da futura ressurreição. Mas, essas verdades penetrarão até ao fundo do coração ou ficarão apenas nos lábios? A mensagem divina de vitória, alegria e paz do Pentecostes deve ser o fundamento inquebrantável do modo de pensar, de reagir e de viver de todo o cristão.

Uma vida nova

É o momento simples e solene da instituição do Novo Testamento. Jesus derroga a antiga economia da Lei e revela-nos que Ele próprio será o conteúdo da nossa oração e da nossa vida.

Vede a alegria que inunda a liturgia de hoje: seja o louvor pleno, sonoro, alegre. É o júbilo cristão que canta a chegada de outro tempo: terminou a antiga Páscoa, inicia-se a nova. O velho é substituído pelo novo, a verdade e faz com que a sombra desapareça, a noite é iluminada pela luz.

Milagre de amor. Este é verdadeiramente o pão dos filhos; o Primogénito do Pai Eterno, oferece-Se-nos como alimento. E o mesmo Jesus Cristo, que aqui nos robustece, espera-nos no Céu como comensais, co-herdeiros e sócios, porque os que se alimentam de Cristo morrerão com a morte terrena e temporal, mas viverão eternamente, porque Cristo é a vida que não termina .

A felicidade eterna, para o cristão que se conforta com o maná definitivo da Eucaristia, começa já agora. Passou o que era velho: deixemos de lado tudo o que é caduco, seja tudo novo para nós - os corações, as palavras e as obras .

Esta é a Boa Nova. É novidade, notícia, porque nos fala de uma profundidade de Amor, de que antes não suspeitávamos. É boa, porque nada é melhor do que unir-nos intimamente a Deus, Bem de todos os bens. É a Boa Nova, porque, de alguma maneira e de um modo indescritível, nos antecipa a eternidade.

Fecundidade da Eucaristia

Quando o Senhor na última Ceia instituiu a Sagrada Eucaristia, era de noite, o que - comenta S. João Crisóstomo - manifestava que os tempos tinham sido cumpridos.Caía a noite sobre o mundo, porque os velhos ritos, os antigos sinais da misericórdia infinita de Deus para com a humanidade iam realizar-se plenamente, abrindo caminho a um verdadeiro amanhecer: a nova Páscoa. A Eucaristia foi instituída durante a noite, preparando de antemão a manhã da Ressurreição.

Também nas nossas vidas temos de preparar essa alvorada. Tudo o, que é caduco, o que é prejudicial, o que não serve - o desânimo, a desconfiança, a tristeza, a cobardia - tudo isso tem de ser deitado fora. A Sagrada Eucaristia introduz a novidade divina nos filhos de Deus e devemos corresponder in novitate sensus , com uma renovação de todo o nosso sentir e de todo o nosso agir. Foi-nos dado um novo princípio de energia, uma raiz poderosa, enxertada no Senhor. Não podemos voltar à antiga levedura, nós que temos o Pão de agora e de sempre.

Referências da Sagrada Escritura
Referências da Sagrada Escritura
Referências da Sagrada Escritura