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Há 7 pontos em «Amigos de Deus» cujo tema é Amor de Deus → e a sua misericórdia.

As circunstâncias daquele servo da parábola, devedor de dez mil talentos, reflectem bem a nossa situação perante Deus: também nós não temos com que pagar a dívida imensa que contraímos por tantas bondades divinas e que aumentámos ao ritmo dos nossos próprios pecados. Embora lutemos denodadamente, não conseguiremos devolver com equidade o muito que o Senhor nos perdoou. Mas a misericórdia divina supre com abundância a impotência da justiça humana. Ele é que pode dar-se por satisfeito e anular a dívida, simplesmente porque é bom e é infinita a sua misericórdia.

A parábola - lembrais-vos bem - termina com uma segunda parte, que é como que o contraponto da precedente. Aquele servo, a quem acabam de perdoar uma dívida enorme, não se compadece de um companheiro que lhe devia apenas cem denários. Aí é que se põe de manifesto a mesquinhez do seu coração. Estritamente falando, ninguém lhe negará o direito de exigir o que é seu; no entanto, algo se revolta dentro de nós e nos diz que essa atitude intolerante se afasta da verdadeira justiça: não é justo que quem, há apenas um momento, recebeu um tratamento misericordioso de favor e compreensão, não reaja ao menos com um pouco de paciência para com o devedor. Reparai que a justiça não se manifesta exclusivamente pelo rigoroso respeito de direitos e deveres, como se se tratasse de problemas aritméticos que se resolvem com somas e subtracções.

A virtude cristã é mais ambiciosa: leva-nos a mostrar-nos agradecidos, afáveis, generosos; a comportar-nos como amigos leais e honrados, tanto nos tempos bons como na adversidade; a ser cumpridores das leis e respeitadores das autoridades legítimas; a rectificar com alegria quando nos damos conta de que nos enganámos ao encarar uma questão. Sobretudo, se somos justos, cumpriremos os nossos compromissos profissionais, familiares, sociais…, sem espaventos nem alardes, trabalhando com empenho e exercitando os nossos direitos, que também são deveres.

Não acredito na justiça dos preguiçosos, porque com o seu dolce far niente - como dizem na minha querida Itália - faltam, e às vezes gravemente, ao mais fundamental dos princípios da equidade: o do trabalho. Não devemos esquecer que Deus criou o homem ut operaretur, para trabalhar; e os outros - a nossa família, a nossa nação, a Humanidade inteira, - dependem também da eficácia do nosso trabalho. Meus filhos, que pobre ideia têm da justiça os que a reduzem a uma simples distribuição de bens materiais!

A miséria e o perdão

Tanto se aproximou o senhor das criaturas, que todos guardamos no coração fome de altura, ânsias de subir muito alto, de fazer o bem. Se agora renovo em ti essas aspirações, é porque quero que te convenças da segurança que Ele pôs na tua alma: se o deixares actuar, servirás - onde estás - como instrumento útil, com uma eficácia insuspeitada. Para que não te afastes por cobardia da confiança que Deus deposita em ti, evita a presunção de menosprezar ingenuamente as dificuldades que aparecerão no teu caminho de cristão.

Não temos de estranhar. Trazemos em nós mesmos - consequência da natureza decaída - um princípio de oposição, de resistência à graça: são as feridas do pecado original, agravadas pelos nossos pecados pessoais. Portanto, temos de empreender as ascensões, as tarefas divinas e humanas - as de cada dia - que sempre desembocam no Amor de Deus, com humildade, com coração contrito, fiados na assistência divina e dedicando os nossos melhores esforços, como se tudo dependesse de nós mesmos.

Enquanto pelejamos - uma peleja que durará até à morte - não excluas a possibilidade de que se levantem, violentos, os inimigos de fora e de dentro. E, como se fosse pequeno o lastro, às vezes, acumular-se-ão na tua mente os erros cometidos, talvez abundantes. Em nome de Deus te digo: não desesperes. Quando isso suceder - não tem necessariamente que suceder, nem será o habitual - converte essa ocasião num motivo para te unires mais com o Senhor; porque Ele, que te escolheu como filho, não te abandonará. Permite a prova, para que ames mais e descubras com mais clareza a sua contínua protecção, o seu Amor.

Insisto, tem ânimo, porque Cristo, que nos perdoou na Cruz, continua a oferecer o seu perdão no Sacramento da Penitência e sempre temos um advogado junto do Pai, Jesus Cristo, o Justo. Ele mesmo é a vítima de propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos mas também pelos de todo o mundo, para que alcancemos a Vitória.

Para a frente, aconteça o que acontecer! Bem agarrado ao braço do Senhor, considera que Deus não perde batalhas. Se, por qualquer motivo, te afastas d'Ele, reage com a humildade de começar e de recomeçar; de fazer de filho pródigo todos os dias, inclusive repetidamente nas vinte e quatro horas do dia; de reconciliar o teu coração contrito na Confissão, verdadeiro milagre do Amor de Deus. Neste Sacramento maravilhoso, o Senhor limpa a tua alma e inunda-te de alegria e de força para não desanimares na tua luta e para voltares de novo sem cansaço a Deus, mesmo quando tudo te pareça obscuro. Além disso, a Mãe de Deus, que é também nossa Mãe, protege-te com a sua solicitude maternal e dá-te confiança no teu caminhar.

Deus não se cansa de perdoar

A sagrada Escritura adverte que até o justo cai sete vezes. Sempre que leio estas palavras, a minha alma estremece com um forte abalo de amor e de dor. Uma vez mais, vem o Senhor ao nosso encontro, com essa advertência divina, para nos falar da sua misericórdia, da sua ternura, da sua clemência, que nunca acabam. Estai seguros: Deus não quer as nossas misérias, mas não as desconhece e conta precisamente com essas debilidades para que nos façamos santos.

Um abalo de amor, dizia-vos. Considero a minha vida e, com sinceridade, vejo que não sou nada, que não valho nada, que não tenho nada, que não posso nada; mais: que sou o nada! Mas Ele é o tudo e, ao mesmo tempo, é meu, e eu sou d'Ele, porque não me repele, porque se entregou por mim. Contemplastes amor maior?

E um abalo de dor, pois examino a minha conduta e assombro-me perante o conjunto das minhas negligências. Basta-me examinar as poucas horas decorridas desde que me levantei hoje, para descobrir tanta falta de amor, de correspondência fiel. Penaliza-me deveras este meu comportamento, mas não me tira a paz. Prostro-me diante de Deus e exponho-lhe claramente a minha situação. Logo tenho a segurança da sua assistência e oiço no fundo do meu coração o que ele me repete devagar: meus es tu!. Sabia - e sei - como és; para a frente!

Não pode ser de outra maneira. Se acorrermos continuamente a pôr-nos na presença do Senhor, aumentará a nossa confiança, ao comprovarmos que o seu Amor e o seu chamamento permanecem actuais: Deus não se cansa de nos amar. A esperança demonstra-nos que, sem Ele, não conseguimos realizar nem o mais pequeno dever; e com ele, com a sua graça, cicatrizarão as nossas feridas; revestir-nos-emos da sua fortaleza para resistir aos ataques do inimigo e melhoraremos. Em resumo: a consciência de que somos feitos de barro ordinário há-de servir-nos, sobretudo, para afirmarmos a nossa esperança em Cristo Jesus.

A virtude da esperança - certeza de que Deus nos governa com a sua providente omnipotência, de que nos dá os meios necessários - fala-nos da contínua bondade do Senhor para com os homens, para contigo, para comigo, sempre disposto a ouvir-nos, porque jamais se cansa de escutar. Interessam-lhe as tuas alegrias, os teus êxitos, o teu amor e também as tuas dificuldades, a tua dor, os teus fracassos. Por isso, não esperes n'Ele somente quando tropeçares por causa da tua debilidade; dirige-te ao teu Pai do Céu nas circunstâncias favoráveis e nas adversas, acolhendo-te à sua misericordiosa protecção. E a certeza da nossa nulidade pessoal - não é necessária grande humildade para reconhecer esta realidade, pois somos uma autêntica multidão de zeros - converter-se-á em fortaleza irresistível, porque à esquerda do nosso eu estará Cristo, e que cifra incomensurável assim resulta! O Senhor é a minha fortaleza e o meu refúgio, quem temerei?.

Acostumai-vos a ver Deus por trás de tudo, a saber que Ele nos aguarda sempre, que nos contempla e nos pede justamente que o sigamos com lealdade, sem abandonarmos o lugar que nos corresponde neste mundo. Temos de caminhar com afectuosa vigilância, com uma sincera preocupação de lutar, para não perder a sua divina companhia.

Com o olhar no Céu

Cresçamos na esperança, que deste modo nos consolidaremos na fé, verdadeiro fundamento das coisas que se esperam e prova das que não se vêem . Cresçamos nesta virtude, que é suplicar ao Senhor que aumente a sua caridade em nós, porque só se confia verdadeiramente no que se ama com todas as forças. E vale a pena amar o Senhor. Vós haveis experimentado, como eu, que a pessoa enamorada se entrega confiante, com uma sintonia maravilhosa, em que os corações batem num mesmo querer. E que será o Amor de Deus? Não sabeis que Cristo morreu por cada um de nós? Sim, por este nosso coração pobre, pequeno, se consumou o sacrifício redentor de Jesus.

Frequentemente, o Senhor fala-nos do prémio que nos ganhou com a sua Morte e Ressurreição. Vou preparar um lugar para vós. Depois que eu tiver ido e vos tiver preparado o lugar, virei novamente e tomar-vos-ei comigo para que, onde eu estou, estejais Vós também. O Céu é a meta do nosso caminho terreno. Jesus Cristo precedeu-nos e ali, na companhia da Virgem e de S. José - a quem tanto venero - dos Anjos e dos Santos, aguarda a nossa chegada.

Manifestações do amor

Agrada-me citar umas palavras que o Espírito Santo nos comunica pela boca do profeta Isaías: discite benefacere, aprendei a fazer o bem. Costumo aplicar este conselho aos diferentes aspectos da nossa luta interior, pois a vida cristã nunca se dá por terminada, visto que o crescimento nas virtudes se obtém como consequência de um empenho efectivo e quotidiano pela santidade.

Como aprendemos nós a realizar qualquer trabalho na sociedade? Primeiro examinamos o fim desejado e os meios para o alcançar. Depois perseveramos no uso desses recursos repetidamente até criarmos um hábito arraigado e firme. Quando aprendemos alguma coisa, descobrimos outras que ignorávamos e constituem um estímulo para continuarmos esse trabalho, sem nunca dizermos "basta".

A caridade para com o próximo é uma manifestação do amor a Deus. Por isso, ao esforçarmo-nos por melhorar nesta virtude, não podemos fixar nenhum limite. Com o Senhor, a única medida é amar sem medida, pois, por um lado jamais chegaremos a agradecer suficientemente o que Ele tem feito por nós e, por outro, assim se revela o mesmo amor de Deus às suas criaturas: com excesso, sem cálculo, sem fronteiras.

A todos os que estamos dispostos a abrir-lhe os ouvidos da alma, Jesus Cristo ensina no Sermão da Montanha o mandato divino da caridade. E, ao terminar, como resumo, explica: amai os vossos inimigos, fazei bem e emprestai sem esperardes nada em troca, e será grande a vossa recompensa e sereis filhos do Altíssimo, porque Ele é bom, mesmo com os ingratos e os maus. Sede, pois, misericordiosos como também o vosso Pai é misericordioso.

A misericórdia não se limita a uma simples atitude de compaixão; a misericórdia identifica-se com a superabundância da caridade que, ao mesmo tempo, traz consigo a superabundância da justiça. Misericórdia significa manter o coração em carne viva, humana e divinamente repassado por um amor rijo, sacrificado e generoso. Assim glosa S. Paulo a caridade no seu canto a esta virtude: A caridade é paciente, é benéfica; a caridade não é invejosa, não actua precipitadamente; não se ensoberbece, não é ambiciosa, não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não pensa mal dos outros, não folga com a injustiça, mas compraz-se na verdade; tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo sofre.

Referências da Sagrada Escritura
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