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Há 5 pontos em «Amigos de Deus» cujo tema é Paz → liberdade e esperança.

A Igreja, nossa Santa Mãe, sempre se pronunciou pela liberdade e rejeitou todos os fatalismos, antigos ou menos antigos. Declarou que cada alma é dona do seu destino para bem ou para mal. E os que não se afastaram do bem irão para a vida eterna; os que cometeram o mal, para o fogo eterno . Impressiona-nos sempre esta terrível capacidade humana, tua e minha, de todos, que simultaneamente é o sinal da nossa nobreza. A tal ponto o pecado é um mal voluntário, que de nenhum modo seria pecado, se não tivesse o seu princípio na vontade; esta afirmação goza de tal evidência, que estão de acordo os poucos sábios e os muitos ignorantes que habitam no mundo .

Volto a levantar o meu coração em acção de graças ao meu Deus, ao meu Senhor, porque nada o impedia de nos criar impecáveis, com um impulso irresistível para o bem; mas julgou que seriam melhores os seusservidores se o servissemlivremente . Que grande é o amor, a misericórdia do nosso Pai! Perante esta realidade das suas loucuras divinas pelos filhos, gostaria de ter mil bocas, mil corações mais, que me permitissem viver num contínuo louvor a Deus Pai, a Deus Filho, a Deus Espírito Santo. Reparem que o Todo-Poderoso, Aquele que governa o Universo com a sua Providência, não deseja servos forçados, prefere filhos livres. Meteu na alma de cada um de nós - embora nasçamos proni ad peccatum, inclinados ao pecado pela queda dos nossos primeiros pais - uma chispa da sua inteligência infinita, a atracção pelo bem, uma ânsia de paz perdurável. E leva-nos a compreender que a verdade, a felicidade e a liberdade se conseguem quando procuramos que germine em nós essa semente de vida eterna.

Escravidão por escravidão - já que de qualquer modo temos de servir, pois, quer queiramos quer não, essa é a condição humana - não há nada melhor do que saber que somos, por Amor, escravos de Deus. Porque nesse momento perdemos a situação de escravos para nos tornarmos, amigos, filhos. E aqui surge a diferença: enfrentamos as ocupações honestas do mundo com a mesma paixão, com o mesmo empenho que os outros, mas com paz no íntimo da alma; com alegria e serenidade, mesmo nas contradições: pois não depositamos a nossa confiança naquilo que é passageiro, mas no que permanece para sempre, não somos filhos da escrava, mas da mulher livre.

Donde nos vem esta liberdade? De Cristo, Nosso Senhor. Esta é a liberdade com que Ele nos redimiu. Por isso ensina: seo Filho vos libertar, sereis verdadeiramente livres . Nós, cristãos, não temos de pedir emprestado a ninguém o verdadeiro sentido deste dom, porque a única liberdade que salva o homem é cristã.

Gosto de falar da aventura da liberdade, porque é essa realmente a aventura da vossa vida e da minha. Livremente - como filhos, insisto, não como escravos - seguimos o caminho que Nosso Senhor assinalou para cada um de nós. E saboreamos esta facilidade de movimentos como um presente de Deus.

Livremente, sem qualquer coacção, porque me apetece, decido-me por Deus. E comprometo-me a servir, a converter a minha existência numa entrega aos outros, por amor ao meu Senhor Jesus. Esta liberdade incita-me a clamar que nada na terra me separará da caridade de Cristo .

Pode-se dizer que Nosso Senhor, perante a missão recebida do Pai, vive o dia-a-dia, tal como aconselhava num dos ensinamentos mais sugestivos que saíram da sua boca divina: não vos preocupeis, quanto à vossa vida, com o que haveis de comer nem, quanto ao vosso corpo, com o que haveis de vestir, pois a vida é mais que o alimento e o corpo mais que o vestuário. Reparai nos corvos: não semeiam nem colhem, não têm despensa nem celeiro, e Deus sustenta-os. Quanto mais valeis vós do que as aves!… Reparai nos lírios, como crescem! Não trabalham nem fiam. Pois eu digo-vos: nem Salomão, em toda a sua magnificência, se vestiu como um deles. Se Deus veste assim a erva que hoje está no campo e amanhã é lançada no fogo, quanto mais a vós, homens de pouca fé ?

Se vivêssemos mais confiados na Providência divina, seguros - com fé firme - desta protecção diária que nunca nos falta, quantas preocupações ou inquietações pouparíamos a nós próprios. Desapareceriam muitos desassossegos que, segundo palavras de Jesus, são próprios dos pagãos, dos homens do mundo, das pessoas que carecem de sentido sobrenatural. Quereria, em confidência de amigo, de sacerdote, de pai, trazer-vos à memória em cada circunstância, que nós, pela misericórdia de Deus, somos filhos desse Pai Nosso, todo-poderoso, que está nos Céus e, ao mesmo tempo, na intimidade dos nossos corações. Quereria gravar a fogo nas vossas mentes que temos todos os motivos para caminhar com optimismo nesta terra, com a alma bem desprendida dessas coisas que parecem imprescindíveis, pois bem sabe o vosso Pai que tendes necessidade delas. E Ele providenciará. Crede que só assim nos portaremos como senhores da Criação e evitaremos a triste escravidão em que tantos caem, porque esquecem a sua condição de filhos de Deus, preocupados com um amanhã ou um depois que talvez nem sequer cheguem a ver.

Iubilate Deo. Exsultate Deo adiutori nostro. Louvai a Deus. Exultai de alegria no Senhor, nossa única ajuda. Jesus, quem não compreende isto, não conhece nada de amores, nem de pecados, nem mesmo de misérias! Eu sou um pobre homem e entendo de pecados, de amores e de misérias. Sabeis o que é elevar-se até ao coração de Deus? Compreendeis o que é uma alma pôr-se diante do Senhor, abrir-lhe o coração e contar-lhe as suas queixas? Eu queixo-me, por exemplo, quando leva para junto d'Ele gente nova, que ainda o poderia servir e amar muitos anos na terra, porque não consigo compreender isso. Mas são gemidos de confiança, pois sei que, se me afastasse dos braços de Deus, logo a seguir tropeçaria. Por isso, acrescento imediatamente, devagar, enquanto aceito os desígnios do Céu: faça-se, cumpra-se, seja louvada e eternamente glorificada a justíssima e amabilíssima Vontade de Deus sobre todas as coisas. Amen. Amen.

Este é o modo de proceder que nos ensina o Evangelho, a habilidade mais santa e a fonte de eficácia no apostolado; este é o manancial do nosso amor e da nossa paz de filhos de Deus, a via pela qual podemos transmitir aos homens carinho e serenidade. Só assim conseguiremos acabar os nossos dias no Amor, tendo santificado o nosso trabalho, procurando aí a felicidade escondida das coisas de Deus. Conduzir-nos-emos com a santa desvergonha das crianças e rejeitaremos a vergonha - a hipocrisia - dos adultos, que receiam voltar para o Pai, depois do fracasso de uma queda.

Termino com a saudação do Senhor que se lê hoje no Santo Evangelho: pax vobis!A paz seja convosco… E encheram-se de alegria os discípulos, ao ver o Senhor, esse Senhor que nos acompanha até ao Pai.

Deus não se cansa de perdoar

A sagrada Escritura adverte que até o justo cai sete vezes. Sempre que leio estas palavras, a minha alma estremece com um forte abalo de amor e de dor. Uma vez mais, vem o Senhor ao nosso encontro, com essa advertência divina, para nos falar da sua misericórdia, da sua ternura, da sua clemência, que nunca acabam. Estai seguros: Deus não quer as nossas misérias, mas não as desconhece e conta precisamente com essas debilidades para que nos façamos santos.

Um abalo de amor, dizia-vos. Considero a minha vida e, com sinceridade, vejo que não sou nada, que não valho nada, que não tenho nada, que não posso nada; mais: que sou o nada! Mas Ele é o tudo e, ao mesmo tempo, é meu, e eu sou d'Ele, porque não me repele, porque se entregou por mim. Contemplastes amor maior?

E um abalo de dor, pois examino a minha conduta e assombro-me perante o conjunto das minhas negligências. Basta-me examinar as poucas horas decorridas desde que me levantei hoje, para descobrir tanta falta de amor, de correspondência fiel. Penaliza-me deveras este meu comportamento, mas não me tira a paz. Prostro-me diante de Deus e exponho-lhe claramente a minha situação. Logo tenho a segurança da sua assistência e oiço no fundo do meu coração o que ele me repete devagar: meus es tu!. Sabia - e sei - como és; para a frente!

Não pode ser de outra maneira. Se acorrermos continuamente a pôr-nos na presença do Senhor, aumentará a nossa confiança, ao comprovarmos que o seu Amor e o seu chamamento permanecem actuais: Deus não se cansa de nos amar. A esperança demonstra-nos que, sem Ele, não conseguimos realizar nem o mais pequeno dever; e com ele, com a sua graça, cicatrizarão as nossas feridas; revestir-nos-emos da sua fortaleza para resistir aos ataques do inimigo e melhoraremos. Em resumo: a consciência de que somos feitos de barro ordinário há-de servir-nos, sobretudo, para afirmarmos a nossa esperança em Cristo Jesus.