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Há 4 pontos em «Entrevistas a S. Josemaria» cujo tema é Mundo → missão cristã na Igreja e no mundo.

Um grande problema feminino é o das mulheres solteiras. Referimo-nos àquelas que, embora com vocação matrimonial, não se chegam a casar. Como não o conseguem, perguntam-se: para que estamos nós no Mundo? Que lhes responderia?

Para que estamos no Mundo? Para amar a Deus com todo o nosso coração e com toda a nossa alma e para estender esse amor a todas as criaturas. Ou será que isto parece pouco? Deus não deixa nenhuma alma abandonada a um destino cego, mas para todas tem um desígnio, a todas chama com uma vocação pessoalíssima, intransferível.

O matrimónio é caminho divino, é vocação. Mas não é o único caminho, nem a única vocação. Os planos de Deus para cada mulher não estão ligados necessariamente ao matrimónio. Têm vocação matrimonial e não chegam a casar-se? Em algum caso pode ser certo, e talvez tenha sido o egoísmo ou o amor-próprio o que impediu que esse chamamento de Deus se cumprisse; mas, outras vezes, a maioria até, isso pode ser um sinal de que o Senhor não lhes deu verdadeira vocação matrimonial. Sim, gostam de crianças, sentem que seriam boas mães, que entregariam o seu coração fielmente ao marido e aos filhos. Mas isso é normal em toda a mulher, também naquelas que, por vocação divina, não se casam - podendo fazê-lo - para se ocuparem do serviço de Deus e das almas.

Não casaram. Pois bem, que continuem, como até agora, amando a vontade de Deus, vivendo na intimidade desse Coração amabilíssimo de Jesus que não abandona ninguém, que é sempre fiel, que vai olhando por nós ao longo desta vida para Se dar a nós desde agora e para sempre.

Além disso, a mulher pode cumprir a sua missão - como mulher, com todas as suas características femininas, também as características afectivas da maternidade - em círculos diferentes da própria família: em outras famílias, na escola, em obras assistenciais, em mil lugares. A sociedade é, às vezes, muito dura - com grande injustiça - para aquelas a quem chama solteironas. Há mulheres solteiras que difundem à sua volta alegria, paz, eficácia, que se sabem entregar nobremente ao serviço dos outros e ser mães, em profundidade espiritual, com mais realidade do que muitas, que são mães apenas fisiologicamente.

Ao longo desta entrevista, tem havido ocasião de comentar aspectos importantes da vida humana o especificamente da vida da mulher, e de reconhecer como o espírito do Opus Dei os valoriza. Para terminar, poder-nos-ia dizer como considera que se deve promove, o papel da mulher na vida da Igreja?

Não posso ocultar que, ao responder a uma pergunta deste tipo, sinto a tentação - contrária ao meu proceder habitual - de fazê-lo de um modo polémico, porque há algumas pessoas que empregam essa linguagem de um modo clerical, usando a palavra Igreja como sinónimo de algo que pertence ao clero, à Hierarquia eclesiástica. E assim, por participação na vida da Igreja entendem, só ou principalmente, a ajuda prestada à vida paroquial, a colaboração em associações “com mandato” da Hierarquia, a assistência activa nas funções litúrgicas e coisas semelhantes.

Quem pensa assim esquece na prática - ainda que talvez o proclame na teoria - que a Igreja é a totalidade do Povo de Deus, o conjunto de todos os cristãos, que, portanto, onde estiver um cristão que se esforce por viver em nome de Jesus Cristo, aí está presente a Igreja.

Com isto não pretendo minimizar a importância da colaboração que a mulher pode prestar à vida da estrutura eclesiástica. Pelo contrário, considero-a imprescindível. Tenho dedicado a minha vida a defender a plenitude da vocação cristã do laicado, dos homens e das mulheres que vivem no meio do mundo e, por conseguinte, a procurar o pleno reconhecimento teológico e jurídico da sua missão na Igreja e no mundo.

Só quero fazer notar que há quem promova uma redução injustificada dessa colaboração, e afirmar que o cristão comum, homem ou mulher, só pode cumprir a sua missão específica, também a que lhe corresponde dentro da estrutura eclesial, desde que não se clericalize, se continuar a ser secular, corrente, pessoa que vive no mundo e que participa dos cuidados do mundo.

Compete aos milhões de mulheres e de homens cristãos que enchem a Terra, levar Cristo a todas as actividades humanas, anunciando com as suas vidas que Deus ama a todos e quer salvar a todos. Por isso, a melhor maneira de participarem na vida da Igreja, a mais importante e a que, pelo menos, tem de estar pressuposta em todas as outras, é a de serem integralmente cristãos no lugar onde estão na vida, onde a sua vocação humana os levou.

Como me emociona pensar em tantos cristãos, homens e mulheres, que, talvez sem se proporem fazê-lo de maneira específica, vivem com simplicidade a sua vida de cada dia, procurando encarnar nela a Vontade de Deus! Fazer-lhes tomar consciência da sublimidade da sua vida, revelar-lhes que isso, que parece sem importância, tem um valor de eternidade, ensinar-lhes a escutar mais atentamente a voz de Deus, que lhes fala através de acontecimentos e situações, é do que a Igreja tem hoje premente necessidade, porque é nesse sentido que Deus a está urgindo.

Cristianizar o mundo inteiro a partir de dentro, mostrando que Jesus Cristo redimiu toda a humanidade - essa é a missão do cristão. E a mulher participará nela da maneira que lhe é própria, tanto no lar como nas tarefas que desempenhe, realizando as suas virtualidades peculiares.

O principal é, pois, que, como Santa Maria - mulher, Virgem e Mãe - vivam voltadas para Deus, pronunciando esse fiat mihi secundum verbum tuum (Luc. 1, 38), faça-se em mim segundo a tua palavra, do qual depende a fidelidade à vocação pessoal, única e intransferível em cada caso, que nos fará cooperadores da obra de salvação que Deus realiza em nós e no mundo inteiro.

Acabais de ouvir a leitura solene dos dois textos da Sagrada Escritura correspondentes à Missa do XXI Domingo depois de Pentecostes. Tendo ouvido a palavra de Deus, já estais situados no âmbito em que se hão-de mover as palavras que agora vos dirijo: palavras de sacerdote, pronunciadas perante uma grande família de filhos de Deus na sua Santa Igreja. Palavras, pois, que desejam ser sobrenaturais, pregoeiras da grandeza de Deus e das suas misericórdias para com os homens; palavras que vos disponham para a impressionante Eucaristia que hoje celebramos aqui no campus da Universidade de Navarra.

Considerai por uns instantes o facto que acabo de mencionar. Celebramos a Sagrada Eucaristia, o sacrifício sacramental do corpo e do sangue de Nosso Senhor, esse mistério de fé que reúne em si todos os mistérios do Cristianismo. Celebramos, portanto, a acção mais sagrada e transcendente que o homem, por graça de Deus, pode realizar nesta vida. Comungar o Corpo e o Sangue de Nosso Senhor é, de certo modo, desligar-nos dos laços de terra e de tempo, para estar já com Deus no Céu, onde o próprio Cristo enxugará as lágrimas dos nossos olhos e onde não haverá morte, nem pranto, nem gritos de fadiga, porque o mundo velho já terá passado [Cfr Ap. XXI, 4].

Esta verdade tão consoladora e profunda, esta significação escatológica da Eucaristia, como costumam denominá-la os teólogos, poderia, no entanto, ser mal entendida; e de facto tem-no sido, sempre que se tem pretendido apresentar a existência cristã como algo de exclusivamente espiritual - espiritualista, quero dizer - próprio da gente pura, extraordinária, que não se mistura com as coisas desprezíveis deste mundo, ou que, quando muito, as tolera como realidade necessariamente justaposta ao espírito, enquanto aqui vivemos.

Quando se vêem as coisas deste modo, o lugar por excelência da vida cristã passa a ser o templo; e ser cristão, nesse caso, consiste em ir ao templo, participar em cerimónias sagradas, incrustar-se numa sociologia eclesiástica, numa espécie de mundo segregado, que se apresenta a si mesmo como a antecâmara do Céu, enquanto o mundo comum segue o seu próprio caminho. A doutrina do Cristianismo e a vida da graça passariam, por conseguinte, como que roçando o atribulado avançar da história humana, mas sem se encontrarem com ele.

Nesta manhã de Outubro, enquanto nos dispomos a penetrar no memorial da Páscoa do Senhor, respondemos simplesmente que não a essa visão deformada do Cristianismo. Reflecti um momento no enquadramento da nossa Eucaristia, da nossa Acção de Graças: encontramo-nos num templo singular; poderíamos dizer que a nave é o campus universitário; o retábulo, a Biblioteca da Universidade; além a maquinaria que levanta novos edifícios; e por cima, o céu de Navarra…

Esta enumeração não vos confirma, de uma forma palpável e inesquecível, que o verdadeiro lugar da vossa existência cristã é a vida corrente? Meus filhos, onde estiverem os homens, vossos irmãos; onde estiverem as vossas aspirações, o vosso trabalho, os vossos amores, é aí que está o sítio do vosso encontro quotidiano com Cristo. É no meio das coisas mais materiais da Terra que devemos santificar-nos, servindo Deus e todos os homens.

O sentido cristão autêntico - que professa a ressurreição de toda a carne - sempre combateu, como é lógico, a desencarnação, sem receio de ser julgado materialista. É lícito, portanto, falar de um materialismo cristão, que se opõe audazmente aos materialismos fechados ao espírito.

Que são os sacramentos - vestígios da Encarnação do Verbo, como afirmaram os antigos - senão a mais clara manifestação deste caminho que Deus escolheu para nos santificar e levar para o Céu? Não vedes que cada sacramento é o amor de Deus, com toda a sua força criadora e redentora, que se nos dá servindo-se de meios materiais? O que é esta Eucaristia - já iminente - senão o Corpo e o Sangue adoráveis do nosso Redentor, que Se nos oferece através da humilda matéria deste mundo - vinho e pão - através dos elementos da natureza cultivados pelo homem, como o último Concílio Ecuménico quis recordar? [Cfr. Gaudium et Spes, nº 38]

Compreende-se, meus filhos, que o Apóstolo pudesse escrever: todas as coisas são vossas; vós sois de Cristo e Cristo de Deus [I Cor III 22-23]. Trata-se de um movimento ascendente que o Espírito Santo, difundido nos nossos corações, quer provocar no mundo: da terra até à glória de Nosso Senhor. E para que ficasse claro que nesse movimento se incluía até o que parece mais prosaico, S. Paulo escreveu também: quer comais, quer bebais, fazei tudo para glória de Deus [I Cor X, 31].