Lista de pontos
Muitas realidades materiais, técnicas, económicas, sociais, políticas, culturais…, abandonadas a si mesmas, ou nas mãos de quem carece da luz da nossa fé, convertem-se em obstáculos formidáveis à vida sobrenatural: formam como que um couto cerrado e hostil à Igreja.
Tu, por seres cristão - investigador, literato, cientista, político, trabalhador… -, tens o dever de santificar essas realidades. Lembra-te de que o universo inteiro - escreve o Apóstolo - está a gemer como que em dores de parto, esperando a libertação dos filhos de Deus.
O trabalho é a vocação original do homem; é uma bênção de Deus; e enganam-se lamentavelmente aqueles que o consideram um castigo.
O Senhor, o melhor dos pais, colocou o primeiro homem no Paraíso - "ut operaretur", para trabalhar.
Estudo, trabalho - deveres iniludíveis para todo o cristão; meios para nos defendermos dos inimigos da Igreja e para atrair, com o nosso prestígio profissional, tantas outras almas que, sendo boas, lutam isoladamente. São arma fundamentalíssima para quem quiser ser apóstolo no meio do mundo.
Está a ajudar-te muito, dizes-me, este pensamento: desde os primeiros cristãos, quantos comerciantes terão sido santos?
E queres demonstrar que também agora isso é possível… O Senhor não te abandonará nesse empenho.
Não se pode santificar um trabalho que humanamente seja uma trapalhice, porque não devemos oferecer a Deus coisas mal feitas.
Uma missão sempre actual e heróica para um cristão corrente: realizar de maneira santa as mais variadas actividades, mesmo aquelas que parecem mais indiferentes.
Trabalhemos, e trabalhemos muito e bem, sem esquecer que a nossa melhor arma é a oração. Por isso, não me canso de repetir que havemos de ser almas contemplativas no meio do mundo que procuram converter o seu trabalho em oração.
Escreves-me na cozinha, junto ao fogão. Começa a tarde. Está frio. Ao teu lado a tua irmã mais nova - a última que descobriu a loucura divina de viver a fundo a sua vocação cristã - descasca batatas. Aparentemente, vais pensando, o seu trabalho é igual ao de antes. Todavia, há tanta diferença!
É verdade: dantes, "só" descascava batatas; agora, santifica-se descascando batatas.
Afirmas que vais compreendendo a pouco e pouco o que quer dizer "alma sacerdotal"… Não te zangues se te respondo que os factos demonstram que o compreendes apenas em teoria. Todos os dias te acontece o mesmo: ao anoitecer, no exame, tudo são desejos e propósitos; de manhã e à tarde, no trabalho, tudo são dificuldades e desculpas.
Assim vives o "sacerdócio santo, para oferecer vítimas espirituais, agradáveis a Deus por Jesus Cristo"?
Ao retomar as tuas ocupações normais, escapou-te uma espécie de grito de protesto: sempre a mesma coisa!
E eu disse-te: - Sim, sempre a mesma coisa. Mas essa actividade vulgar, igual à dos teus companheiros de profissão, há-de ser para ti uma oração contínua, com as mesmas palavras íntimas, mas cada dia com música diferente.
É missão muito nossa transformar a prosa desta vida em decassílabos, em poesia heróica.
Aquele "stultorum infinitus est numerus" - é infinito o número de néscios -, que se lê na Escritura, parece aumentar dia a dia. Nos lugares mais diversos, nas situações mais inesperadas, cobertos pela capa do prestígio que os cargos dão (e até pelas "virtudes" do cargo…), quanto disparate e quanta falta de bom-senso terás de suportar!
Mas não compreendo que percas o sentido sobrenatural da vida, e fiques indiferente. Muito baixo é o teu estado interior se aguentas essas situações (e não tens outro remédio senão aguentá-las!) por motivos humanos…
Se não os ajudas a descobrir o bom caminho, com um trabalho responsável e bem acabado (santificado!), fazes-te como eles - néscio - ou és seu cúmplice.
Para tirares importância ao trabalho de outro, murmuraste: - "Não fez mais do que cumprir o seu dever…".
E eu comentei: - "Parece-te pouco?". Por cumprirmos o nosso dever o Senhor dá-nos a felicidade do Céu: "Euge serve bone et fidelis… intra in gaudium Domini tui" - muito bem, servo bom e fiel; entra na felicidade eterna!
Documento impresso de https://escriva.org/pt-pt/book-subject/surco/33211/ (09/05/2024)