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Há 4 pontos em «Amigos de Deus» cujo tema é Vocação cristã  → encontro com a cruz de Cristo.

O caminho do cristão

Que transparente se torna o ensinamento de Cristo! Como de costume, abramos o Novo testamento, desta vez no capítulo XI de S. Mateus: Aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração. Vês? Temos que aprender d'Ele, de Jesus, nosso único modelo. Se queres progredir, evitando tropeços e extravios, só tens que andar pelo caminho que Ele percorreu, pôr os teus pés nos sinais das suas pegadas, penetrar no seu Coração humilde e paciente, beber do manancial dos seus mandatos e afectos; numa palavra, tens de identificar-te com Jesus Cristo, tens de procurar converter-te verdadeiramente noutro Cristo entre os teus irmãos, os homens.

Para que ninguém se engane, vamos ler outra passagem de S. Mateus. No capítulo XVI, o Senhor é ainda mais preciso na sua doutrina: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. O caminho de Deus é de renúncia, de mortificação, de entrega, mas não de tristeza ou de apoucamento.

Revê o exemplo de Cristo, do presépio de Belém até ao trono do Calvário. Considera a sua abnegação, as suas privações: fome, sede, fadiga, calor, sono, maus tratos, incompreensões, lágrimas…; e a sua alegria por salvar a humanidade inteira. Gostaria que gravasses, agora, profundamente, na tua cabeça e no teu coração - para o meditares muitas vezes e o traduzires em consequências práticas - aquele resumo de S. Paulo, quando convidava os Efésios a seguir, sem vacilações, os passos do Senhor: Sede imitadores de Deus, visto que sois seus filhos muito queridos, e procedei com amor, tal como Cristo nos amou e se ofereceu a si mesmo a Deus, como oferenda e hóstia de odor suavíssimos.

Jesus entregou-se a si mesmo, feito holocausto por amor. E tu, discípulo de Cristo; tu, filho predilecto de Deus; tu, que foste comprado a preço de Cruz; tu também deves estar disposto a negar-te a ti mesmo. Portanto, sejam quais forem as circunstâncias concretas que atravessemos, nem tu nem eu podemos levar uma conduta egoísta, aburguesada, cómoda, dissipada…, - perdoa a minha sinceridade - néscia! Se ambicionas a estima dos homens e anseias ser considerado ou apreciado e se não procuras senão uma vida de prazer, desviaste-te do caminho… Na cidade dos santos, só aos que passam pelo caminho áspero, apertado e estreito das tribulações se permite entrar, descansar e reinar com o Rei pelos séculos sem fim.

É necessário que te decidas a carregar com a cruz voluntariamente. Senão, dirás com a língua que imitas Cristo, mas os teus actos desmenti-lo-ão; assim não conseguirás tratar com intimidade o Mestre nem o amarás verdadeiramente. É urgente que nós, os cristãos, nos convençamos bem desta realidade: não andamos perto do Senhor, quando não sabemos privar-nos espontaneamente de tantas coisas que o capricho, a vaidade, o prazer, o interesse… reclamam. Não deve passar um dia sem que o tenhas condimentado com a graça e o sal da mortificação. E afasta a ideia de que estás, então, reduzido a ser um desgraçado. Pobre felicidade será a tua, se não aprendes a vencer-te a ti próprio, se te deixas esmagar e dominar pelas tuas paixões e veleidades, em vez de tomares a tua cruz com galhardia.

Com os olhos postos na meta

Se vos recordo estas verdades fortes, é para vos convidar a examinar atentamente os motivos que impulsionam a vossa conduta, com o fim de rectificardes o que necessite de rectificação, dirigindo tudo ao serviço de Deus e dos vossos irmãos, os homens. Reparai que o Senhor passou ao nosso lado, olhou-nos com carinho e chamou--nos com a sua vocação santa, não pelas nossas obras mas pelo seu beneplácito e com a graça que nos foi dada em Jesus Cristo antes de todos os séculos.

Purificai a intenção, ocupai-vos de todas as coisas por amor a Deus, abraçando com alegria a cruz de cada dia. Porque penso que estas ideias devem estar esculpidas no coração dos cristãos, tenho repetido milhares de vezes o seguinte: quando não nos limitamos a tolerar e, pelo contrário, amamos a contradição, a dor física ou moral e a oferecemos a Deus em desagravo dos nossos pecados pessoais e dos pecados de todos os homens, asseguro-vos que, então, essa pena não esmaga.

Já não se leva uma cruz qualquer, descobre-se a Cruz de Cristo, com o consolo de que o Redentor se encarrega de suportar o peso. Nós colaboramos como Simão de Cirene que, quando regressava do trabalho na sua granja, pensando num repouso merecido, se viu forçado a tomar a cruz sobre os seus ombros para ajudar Jesus. Ser voluntariamente Cireneu de Cristo, acompanhar tão de perto a sua Humanidade sofredora, reduzida a um farrapo, para uma alma enamorada não significa infelicidade, antes traz a certeza da proximidade de Deus, que nos abençoa com essa escolha.

Com muita frequência, não poucas pessoas me comentavam com assombro a alegria que, graças a Deus, têm e contagiam os meus filhos no Opus Dei. Perante a evidência desta realidade, respondo sempre com a mesma explicação, porque não conheço outra: o fundamento da sua felicidade consiste em não terem medo nem da vida nem da morte, em não se assustarem perante a tribulação, no esforço diário por viverem com espírito de sacrifício, constantemente dispostos - apesar das misérias e debilidades pessoais - a negarem-se a si mesmos, para tornarem o caminho cristão mais fácil e agradável aos outros.

Mas não esqueçamos que estar com Jesus é seguramente encontrar-se com a sua Cruz. Quando nos abandonamos nas mãos de Deus, é frequente que Ele permita que saboreemos a dor, a solidão, as contradições, as calúnias, as difamações, os escárnios, por dentro e por fora: porque quer conformar-nos à Sua imagem e semelhança e permite também que nos chamem loucos e que nos tomem por néscios.

É a altura de amar a mortificação passiva que vem - oculta, ou descarada e insolente - quando não a esperamos. Chegam a ferir as ovelhas com as pedras que deviam atirar-se aos lobos: quem segue Cristo experimenta na própria carne que aqueles que o deviam amar se comportam com ele de uma maneira que vai da desconfiança à hostilidade, da suspeita ao ódio. Olham-no com receio, como um mentiroso, porque não acreditam que possa haver relação pessoal com Deus, vida interior; em contrapartida, com o ateu e com o indiferente, geralmente rebeldes e desavergonhados, desfazem-se em amabilidades e compreensão.

E talvez Nosso Senhor permita que o Seu discípulo se veja atacado com a arma, que nunca é honrosa para aquele que a empunha, das injúrias pessoais; com lugares comuns, fruto tendencioso e delituoso de uma propaganda massificada e mentirosa… Porque o bom gosto e a cortesia não são coisas muito comuns.

Quem cultiva uma teologia incerta e uma moral relaxada, sem freios; quem pratica, a seu capricho, uma liturgia duvidosa, com uma disciplina de hippies e umgoverno irresponsável, não é de admirar que propague contra os que só falam de Jesus Cristo invejas, suspeitas, acusações falsas, ofensas, maus tratos, humilhações, intrigas e vexames de todo o género.

Assim vai Jesus esculpindo as almas dos Seus, sem deixar de lhes dar interiormente serenidade e alegria, porque eles entendem muito bem que - com cem mentiras juntas - os demónios não são capazes de fazer uma verdade: e grava nas suas vidas a convicção de que só se sentirão bem quando renunciarem à comodidade.