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Há 5 pontos em «Amigos de Deus» cujo tema é Jesus Cristo  → exemplo de humildade e serviço.

Quando S. Paulo evoca este mistério, irrompe também num hino de júbilo, que hoje poderemos saborear com vagar: Tende nos vossos corações os mesmos sentimentos de Jesus Cristo, o qual, tendo a natureza de Deus, não foi por usurpação, mas por essência, o ser igual a Deus; e, não obstante, aniquilou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens e reduzido à condição de homem. Humilhou-se a si mesmo, fazendo-se obediente até à morte, e morte de Cruz.

Jesus Cristo, Nosso Senhor, propõe-nos com muita frequência na sua pregação o exemplo da sua humildade: aprendei de mim que sou manso e humilde de coração, para que tu e eu aprendamos que não há outro caminho; que só o conhecimento sincero do nosso nada é capaz de atrair sobre nós a graça divina. Por nós, Jesus veio padecer fome e alimentar-nos, veio sentir sede e dar-nos de beber, veio vestir-se da nossa mortalidade e vestir-nos de imortalidade, veio pobre para nos tornar ricos.

Quando se aproxima o momento da sua Paixão e Jesus quer mostrar de um modo gráfico a sua realeza, entra triunfalmente em Jerusalém, montado num burrico! Estava escrito que o Messias havia de ser um rei de humildade: Dizei à filha de Sião: Eis que o teu Rei vem a ti manso, montado sobre uma jumenta e o jumentinho, filho da que leva o jugo.

Agora, na Última Ceia, Cristo preparou tudo para se despedir dos seus discípulos, enquanto estes se envolviam pela centésima vez na disputa sobre quem seria o maior desse grupo escolhido. Jesus levantou-se da mesa, depôs o seu manto e, pegando numa toalha, cingiu-se. Depois lançou água numa bacia e começou a lavar os pés dos discípulos e a limpar-lhos com a toalha com que estava cingido .

Pregou de novo com o exemplo, com obras. Diante dos discípulos, que discutiam por motivos de soberba e de vanglória, Jesus inclina-se e cumpre gostosamente o trabalho próprio de um servo. Depois, quando volta para a mesa, comenta: Compreendeis o que vos fiz? Vós chamais-me Mestre e Senhor e dizeis bem, porque o sou. Se eu, pois, que sou o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, deveis também lavar-vos os pés uns aos outros. A mim comove-me esta delicadeza do nosso Cristo, porque não afirma: se eu faço isto, quanto mais deveis fazer vós! Coloca-se ao mesmo nível, não coage: fustiga amorosamente a falta de generosidade daqueles homens.

Como aos primeiros doze, o Senhor também nos pode insinuar a nós, como de facto nos insinua continuamente: exemplum dedi vobis, dei-vos exemplo de humildade. Converti-me em servo, para que vós saibais, com coração manso e humilde, servir todos os homens.

Nunca perguntaste a ti próprio, movido por uma santa curiosidade, de que modo levou Jesus a cabo este excesso de amor? É, de novo, São Paulo quem nos responde: tendo a natureza de Deus (…), não obstante, aniquilou-se a si mesmo tomando a forma de servo, tornando-se semelhante aos homens e reduzido à condição de homem. Meus filhos, pasmai agradecidos ante este mistério e aprendei: todo o poder, toda a formosura, toda a majestade, toda a harmonia infinita de Deus, com as suas grandes e incomensuráveis riquezas - todo um Deus - ficou escondido na Humanidade de Cristo para nos servir. O Omnipotente apresenta-se decidido a ocultar por algum tempo a sua glória, para facilitar o encontro redentor com as suas criaturas.

Escreve o evangelista S. João: ninguém jamais viu Deus; o Filho Unigénito que está no seio do Pai é que o deu a conhecer, comparecendo ante o olhar atónito dos homens: primeiro, como um recém-nascido, em Belém; depois, como um menino igual aos outros; mais tarde, no Templo, como um adolescente, inteligente e vivo; e, por fim, com aquela figura amável e atraente do Mestre que movia os corações das multidões que o acompanhavam entusiasmadas.

Bastam algumas provas do Amor de Deus que se encarna para que a sua generosidade nos toque a alma, nos incendeie, nos mova com suavidade a uma dor contrita pelo nosso comportamento, em tantas ocasiões mesquinho e egoísta. Jesus não tem inconveniente em rebaixar-se, para nos elevar da miséria à dignidade de filhos de Deus, de irmãos seus. Pelo contrário, tu e eu muitas vezes enchemo-nos nesciamente de orgulho pelos dons e talentos recebidos, até ao ponto de os converter em pedestal para nos impormos aos outros, como se o mérito de algumas acções, acabadas com relativa perfeição, dependesse exclusivamente de nós: Que possuis tu que não tenhas recebido de Deus? E se o recebeste, porque te glorias como se o não tivesses recebido?.

Ao considerar a entrega de Deus e o seu aniquilamento - falo para que o meditemos, pensando cada um em si mesmo-, a vanglória, a presunção do soberbo revela-se um pecado horrendo, precisamente porque coloca a pessoa no extremo oposto ao modelo que Jesus nos assinalou com a sua conduta. Pensai nisto devagar: Ele humilhou-se, sendo Deus. O homem, cheio do seu próprio eu, pretende enaltecer-se a todo o custo, sem reconhecer que está feito de barro e barro de má qualidade.

A caridade, que é como que um transbordar generoso da justiça, exige em primeiro lugar o cumprimento do dever: começa-se pelo que é justo; continua-se pelo que é mais equitativo… Mas para amar requer-se muita finura, muita delicadeza, muito respeito, muita afabilidade; numa palavra, seguir aquele conselho do Apóstolo: levai as cargas uns dos outros e assim cumprireis a lei de Cristo. Então, sim, vivemos plenamente a caridade, realizamos o mandato de Jesus.

Para mim não existe exemplo mais claro dessa união prática da justiça com a caridade do que o comportamento das mães. Amam com idêntico carinho todos os seus filhos e esse amor leva-as precisamente a tratá-los de modo diferente - com uma justiça desigual - visto que cada um é diferente dos outros.

Pois também em relação aos nossos semelhantes a caridade aperfeiçoa e completa a justiça, porque nos leva a proceder de maneira desigual com os desiguais, adaptando-nos às suas circunstâncias concretas, a fim de comunicarmos alegria a quem está triste, ciência a quem carece de formação, afecto a quem se sente só… A justiça determina que se dê a cada um o que lhe pertence; ora isto não significa dar a todos a mesma coisa. O igualitarismo utópico é fonte das maiores injustiças.

Para procedermos sempre assim, como essas boas mães, precisamos de esquecer-nos de nós mesmos e de não aspirar a outra superioridade senão a de servir os outros, como Jesus Cristo, que afirmava: o Filho do homem veio, não para ser servido, mas para servir. Isto exige a inteireza da submissão da nossa vontade ao modelo divino, trabalhar para todos, lutar pela felicidade eterna e pelo bem-estar dos outros. Não conheço melhor caminho para ser justo do que uma vida de entrega e de serviço.