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Há 7 pontos em «Amigos de Deus» cujo tema é Fraquezas.

Vamos considerar, durante alguns instantes, os textos desta Missa de Terça-Feira de Paixão, para aprendermos a distinguir o endeusamento bom do endeusamento mau. Vamos falar de humildade, porque esta é a virtude que nos ajuda a conhecer simultaneamente a nossa miséria e a nossa grandeza.

A nossa miséria salta à vista com demasiada evidência. Não me refiro às limitações naturais: a tantas aspirações grandes com as quais o homem sonha e que porventura nunca conseguirá realizar, mesmo que seja só por falta de tempo. Penso em tudo o que fazemos mal, nas quedas, nos erros que poderiam evitar-se e não se evitam. Estamos a experimentar constantemente a nossa ineficácia. Mas, às vezes, parece que todas estas coisas se juntam e se nos manifestam com um relevo maior, para que nos apercebamos de quão pouco somos. Que fazer?

Expecta Dominum, espera no Senhor; vive de esperança, sugere-nos a Igreja, com amor e com fé. Viriliter age , porta-te varonilmente. Que importa que sejamos criaturas de lodo, se temos a esperança posta em Deus? E se alguma vez a alma sofre uma queda, um retrocesso - não é necessário que isso aconteça - aplica-se-lhe o remédio, como se procede normalmente com a saúde do corpo, e recomeça-se de novo!

Não reparastes como as famílias que possuem alguma peça frágil e decorativa de valor - um jarrão, por exemplo - o rodeiam de cuidados para que não se quebre? Até que um dia, o menino, ao brincar, atira-o ao chão e aquela recordação preciosa parte-se em bocados. O desgosto é grande, mas logo a seguir procura-se arranjá-lo. Recompõe-se, colam-se os pedaços com todo o cuidado e, uma vez restaurado, fica tão bonito como dantes.

No entanto, se o objecto é de louça ou simplesmente de barro cozido, habitualmente bastam uns gatos, uns arames de ferro ou de outro metal, que mantêm unidos os bocados. E a peça, assim reparada, ganha um encanto original.

Levemos isto à vida interior. Perante as nossas misérias e os nossos pecados, perante os nossos erros - mesmo que sejam, pela graça de Deus, de pouca monta - recorramos à oração e digamos ao nosso Pai: Senhor, na minha pobreza, na minha fragilidade, neste meu barro de vasilha quebrada, põe-me, Senhor, uns gatos e - com a minha dor e o Teu perdão - serei mais forte e mais gracioso do que dantes! Uma oração consoladora para a repetirmos quando se parta este nosso pobre barro.

Não nos admiremos por sermos tão fracos; não fiquemos chocados pelo facto de verificarmos que quebramos por coisas de nada. Confiemos no Senhor, que tem sempre auxílio preparado: o Senhor é a minha luz e a minha salvação, a quem temerei?. A ninguém. Tratando deste modo com o nosso Pai do Céu, não sintamos medo de ninguém nem de nada.

Humildade e alegria

Livra-me de tudo o que há de mau e perverso no homem. De novo o texto da Missa nos fala do bom endeusamento: faz ressaltar diante dos nossos olhos o mau barro de que somos feitos, com todas as suas malvadas inclinações. E depois suplica emittte lucem tuam , envia a tua luz e a tua verdade, que me guiaram e trouxeram ao teu monte santo. Não me importo de vos contar que me emocionei ao recitar estas palavras do Gradual.

Como é que nos temos de comportar para adquirir esse eudeusamento bom? No evangelho, lemos que Jesus não queria ir à Judeia, porque os judeus o queriam matar . Ele, que com um desejo da sua vontade poderia eliminar os seus inimigos, empregava também os meios humanos. Ele, que era Deus e a quem bastava uma decisão sua para mudar as circunstâncias, deixou-nos uma lição encantadora: não foi à Judeia. Disseram-lhe, pois, seus parentes: Sai daqui e vai para a Judeia, a fim de que também os teus discípulos vejam as obras que fazes. Queriam que Ele desse espectáculo. Vedes? Vedes o que é uma lição de endeusamento bom e de endeusamento mau?

Endeusamento bom: esperem em Ti - canta o Ofertório - todos os que conhecem o teu nome, Senhor, porque nunca abandonas os que Te procuram. E vem o regozijo deste barro cheio de gatos, porque não se esqueceu das orações dos pobres, dos humildes.

Piedade, intimidade de filhos

A piedade que nasce da filiação divina é uma atitude profunda da alma, que acaba por informar toda a existência: está presente em todos os pensamentos, em todos os desejos, em todos os afectos. Não tendes visto como, nas famílias, os filhos, mesmo sem repararem, imitam os pais: repetem os seus gestos, seguem os seus costumes, se parecem com eles em tantos modos de comportar-se?

Pois o mesmo acontece na conduta de um bom filho de Deus. Chega-se também, sem se saber como nem por que caminho, a esse endeusamento maravilhoso que nos ajuda a olhar os acontecimentos com o relevo sobrenatural da fé; amam-se todos os homens como o nosso Pai do Céu os ama e - isto é o que mais importa - consegue-se um brio novo no esforço quotidiano para nos aproximarmos do Senhor. As misérias não têm importância, insisto, porque aí estão ao nosso lado os braços amorosos do nosso Pai Deus para nos levantar.

Se reparardes bem, é muito diferente a queda de uma criança e a queda de uma pessoa crescida. Para as crianças, uma queda, em geral, não tem importância; tropeçam com tanta frequência! E se começam a chorar, o pai lembra-lhes: os homens não choram. Assim se encerra o incidente com o empenho do miúdo por contentar o seu pai.

Vede, pelo contrário, o que acontece quando um homem adulto perde o equilíbrio e cai no chão. Se não fosse por compaixão, provocaria hilariedade, riso. Mas, além disso, a queda talvez tenha consequências graves e, num ancião, pode mesmo produzir uma fractura irreparável. Na vida interior, a todos nos convém ser quasi modogeniti infantes, como esses miuditos que parecem de borracha, que se divertem até com os seus trambolhões, porque imediatamente se põem de pé e continuam com as suas correrias e também porque não lhes falta, quando é precisa, a consolação dos pais.

Se procurarmos portar-nos como eles, os tropeções e os fracassos - aliás inevitáveis - na vida interior, nunca se transformarão em amargura. Reagiremos com dor, mas sem desânimo, e com um sorriso que brota, como a água límpida, da alegria da nossa condição de filhos desse Amor, dessa grandeza, dessa sabedoria infinita, dessa misericórdia, que é o nosso Pai. Aprendi durante os meus anos de serviço ao Senhor a ser filho pequeno de Deus. E isto vos peço: que sejais quasi modo geniti infantes, meninos que desejam a palavra de Deus, o pão de Deus, o alimento de Deus, a fortaleza de Deus para se comportarem de agora em diante, como homens cristãos.

Que sejais, espiritualmente, muito crianças! Quanto mais, melhor. Di-lo a experiência deste sacerdote que teve de se levantar muitas vezes, ao longo destes trinta e seis anos (que longos e ao mesmo tempo, que curtos me parecem!) em que tem procurado cumprir uma Vontade precisa de Deus. Houve uma coisa que sempre me ajudou: ser sempre criança e meter-me continuamente no regaço de minha Mãe e no Coração de Cristo, meu Senhor.

As grandes quedas, as que causam destroços sérios na alma, e às vezes com resultados quase irremediáveis, procedem sempre da soberba de nos crermos adultos, auto-suficientes. Nesses casos, torna-se predominante na pessoa uma espécie de incapacidade de pedir ajuda a quem a pode dar: não só a Deus, mas também ao amigo ou ao sacerdote. E aquela pobre alma, isolada na sua desgraça, afunda-se na desorientação e no descaminho.

Peçamos a Deus, agora mesmo, que nunca permita que nos sintamos satisfeitos, que aumente sempre em nós a ânsia do seu auxílio, da sua Palavra, do seu Pão, do seu consolo, da sua fortaleza: rationabile, sine dolo lac concupiscite. Fomentai a fome, a aspiração de ser como crianças. Convencei-vos de que é a melhor forma de vencer a soberba. Persuadi-vos de que é o único remédio para que a nossa maneira de actuar seja boa, grande, divina. Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e vos tornardes como meninos, não entrareis no reino dos céus.

Vêm-me de novo à memória as recordações da minha juventude. Que demonstração de fé! Ainda julgo ouvir o cantar litúrgico, respirar o aroma do incenso, ver milhares de milhares de homens, cada um com um grande círio, como que simbolizando a sua miséria, mas com coração de meninos: como crianças que talvez não se atrevam a levantar os olhos para a cara do pai. Reconhece e compreende que má e amarga coisa é para ti o teres abandonado o Senhor teu Deus. Renovemos a firme decisão de nunca nos afastarmos do Senhor por causa dos interesses terrenos. Façamos crescer a sede de Deus, com propósitos concretos para a nossa vida: como crianças que reconhecem a sua indigência e procuram e chamam incessantemente o Pai.

Mas volto àquilo que antes estava a comentar. Precisamos de aprender a portar-nos como crianças, precisamos de aprender a ser filhos de Deus. E, simultaneamente, ir transmitindo aos outros essa mentalidade que, no meio das naturais fraquezas, nos tornará fortes na fé, fecundos nas obras, seguros no caminho, de tal forma que, seja qual for a espécie de erro que possamos cometer, mesmo o mais desagradável, nunca hesitaremos em reagir e em voltar ao caminho da nossa filiação divina, que nos leva aos braços abertos e expectantes do nosso Pai, Deus.

Qual de vós não se lembra dos braços de seu pai? Provavelmente não seriam tão carinhosos, tão meigos e delicados como os da mãe. Mas aqueles braços robustos, fortes, apertavam-nos com calor e com segurança. Senhor, obrigado por esses braços duros! Obrigado por essas mãos fortes! Obrigado por esse coração terno e firme! E ia agradecer-Te também os meus erros! Mas isso não, porque não os queres! No entanto, compreende-los, desculpa-los, perdoa-los.

Esta é a sabedoria que Deus espera que vivamos nas relações com Ele, verdadeira manifestação de ciência matemática: reconhecer que somos um zero à esquerda… Mas o nosso Pai Deus ama-nos a cada um de nós, tal como somos! Eu, que não passo de um pobre homem, gosto de cada um de vós tal como sois; imaginai como será o Amor de Deus, se lutarmos, se nos empenharmos em viver de acordo com a nossa consciência bem formada.

A miséria e o perdão

Tanto se aproximou o senhor das criaturas, que todos guardamos no coração fome de altura, ânsias de subir muito alto, de fazer o bem. Se agora renovo em ti essas aspirações, é porque quero que te convenças da segurança que Ele pôs na tua alma: se o deixares actuar, servirás - onde estás - como instrumento útil, com uma eficácia insuspeitada. Para que não te afastes por cobardia da confiança que Deus deposita em ti, evita a presunção de menosprezar ingenuamente as dificuldades que aparecerão no teu caminho de cristão.

Não temos de estranhar. Trazemos em nós mesmos - consequência da natureza decaída - um princípio de oposição, de resistência à graça: são as feridas do pecado original, agravadas pelos nossos pecados pessoais. Portanto, temos de empreender as ascensões, as tarefas divinas e humanas - as de cada dia - que sempre desembocam no Amor de Deus, com humildade, com coração contrito, fiados na assistência divina e dedicando os nossos melhores esforços, como se tudo dependesse de nós mesmos.

Enquanto pelejamos - uma peleja que durará até à morte - não excluas a possibilidade de que se levantem, violentos, os inimigos de fora e de dentro. E, como se fosse pequeno o lastro, às vezes, acumular-se-ão na tua mente os erros cometidos, talvez abundantes. Em nome de Deus te digo: não desesperes. Quando isso suceder - não tem necessariamente que suceder, nem será o habitual - converte essa ocasião num motivo para te unires mais com o Senhor; porque Ele, que te escolheu como filho, não te abandonará. Permite a prova, para que ames mais e descubras com mais clareza a sua contínua protecção, o seu Amor.

Insisto, tem ânimo, porque Cristo, que nos perdoou na Cruz, continua a oferecer o seu perdão no Sacramento da Penitência e sempre temos um advogado junto do Pai, Jesus Cristo, o Justo. Ele mesmo é a vítima de propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos mas também pelos de todo o mundo, para que alcancemos a Vitória.

Para a frente, aconteça o que acontecer! Bem agarrado ao braço do Senhor, considera que Deus não perde batalhas. Se, por qualquer motivo, te afastas d'Ele, reage com a humildade de começar e de recomeçar; de fazer de filho pródigo todos os dias, inclusive repetidamente nas vinte e quatro horas do dia; de reconciliar o teu coração contrito na Confissão, verdadeiro milagre do Amor de Deus. Neste Sacramento maravilhoso, o Senhor limpa a tua alma e inunda-te de alegria e de força para não desanimares na tua luta e para voltares de novo sem cansaço a Deus, mesmo quando tudo te pareça obscuro. Além disso, a Mãe de Deus, que é também nossa Mãe, protege-te com a sua solicitude maternal e dá-te confiança no teu caminhar.

Referências da Sagrada Escritura
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