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Há 8 pontos em «Amigos de Deus» cujo tema é Ambiente.

Vida interior: é uma exigência do chamamento que o Mestre fez à alma de todos. Temos de ser santos - di-lo-ei com uma expressão castiça - da cabeça aos pés: cristãos de verdade, autênticos, canonizáveis; se não, fracassámos como discípulos do único Mestre. Pensem também que Deus, ao reparar em nós, ao conceder-nos a sua graça para lutarmos por alcançar a santidade no meio do mundo, nos impõe também a obrigação do apostolado. Compreendam que, até humanamente, como comenta um Padre da Igreja, a preocupação pelas almas brota como uma consequência lógica dessa escolha: quando descobris que algo vos foi proveitoso, tentais atrair os outros. Tendes pois que desejar que outros vos acompanhem pelos caminhos de Nosso Senhor. Se ides ao foro ou aos banhos e deparais com alguém que esteja desocupado, convidai-lo para que vos acompanhe. Aplicai ao espiritual este costume terreno e, quando fordes a Deus, não o façais sós.

Se não queremos desperdiçar o tempo inutilmente - nem sequer com falsas desculpas das dificuldades exteriores do ambiente, que nunca faltaram desde o princípio do cristianismo - devemos ter muito presente que, de um modo normal, Jesus Cristo vinculou à vida interior a eficácia da nossa acção para arrastar os que nos rodeiam. Cristo pôs a santidade como condição para a eficácia da acção apostólica; corrijo-me, o esforço da nossa fidelidade, porque na terra nunca seremos santos. Parece inacreditável, mas Deus e os homens precisam que, da nossa parte, haja uma fidelidade sem condições, sem eufemismos, que chegue até às últimas consequências, sem mediocridade ou concessões, em plenitude de vocação cristã assumida e praticada com delicadeza.

Valor exemplar da vida profissional

Temos de evitar o erro de considerar que o apostolado se reduz ao testemunho de algumas práticas piedosas. Tu e eu somos cristãos, mas, ao mesmo tempo e sem solução de continuidade, cidadãos e trabalhadores, com obrigações bem nítidas que temos de cumprir exemplarmente, se deveras queremos santificar-nos. É Jesus Cristo que nos estimula: Vós sois a luz do mundo. Não se pode ocultar uma cidade situada sobre um monte. Nem se acende uma candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas sim sobre o candelabro, e assim alumia quantos estão em casa. Brilhe do mesmo modo a vossa luz diante dos homens, a fim de que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem vosso Pai que está nos céus.

Seja qual for, o trabalho profissional converte-se numa luz que ilumina os vossos colegas e amigos. Por isso, costumo repetir aos que se incorporam no Opus Dei, e a minha afirmação vale também para todos aqueles que me ouvis: que me importa que me digam que fulano de tal é um bom filho meu - um bom cristão - mas um mau sapateiro?! Se não se esforçar por aprender bem o seu ofício, ou por executar o seu trabalho com esmero, não poderá santificá-lo nem oferecê-lo ao Senhor. Ora, a santificação do trabalho ordinário constitui como que o fundamento da verdadeira espiritualidade para aqueles que, como nós, estão decididos a viver na intimidade de Deus, imersos nas realidades temporais.

Lutai contra essa excessiva compreensão que cada um tem para consigo mesmo: sede exigentes para vós próprios. Às vezes, pensamos demasiadamente na saúde e no descanso, que aliás não deve faltar, precisamente porque é preciso voltar ao trabalho com forças renovadas. Esse descanso, porém, escrevi-o há já tantos anos, não é não fazer nada, mas distrairmo-nos em actividades que exigem menos esforço.

Noutras ocasiões, com falsas desculpas, somos excessivamente comodistas, esquecemo-nos da bendita responsabilidade que pesa sobre os nossos ombros, conformamo-nos com fazer o que é minimamente indispensável e deixamo-nos arrastar por razões sem razão para nada fazermos, enquanto Satanás e os seus amigos não tiram férias. Ouve e medita com atenção o que S. Paulo escrevia aos cristãos que eram escravos; instava-os a obedecerem aos seus amos: não os sirvais como quem trabalha somente porque é visto e para agradar aos homens, mas como servos de Cristo que fazem a vontade de Deus com todo o coração e servi-os com amor, sabendo que servis ao Senhor e não a homens . Que bom conselho para que o sigamos tu e eu!

Peçamos luz a Jesus Cristo Nosso Senhor e roguemos-lhe que nos ajude a descobrir, a cada instante, o sentido divino que transforma a nossa vocação profissional no gonzo sobre o qual assenta e gira a nossa chamada à santidade. Verificareis no Evangelho que Jesus era conhecido como faber, filius Mariæ, o trabalhador, o filho de Maria. Também nós, com orgulho santo, temos de demonstrar com factos que somos trabalhadores, homens e mulheres de trabalho!

Porque havemos de nos comportar sempre como enviados de Deus, devemos ter bem presente que não o servimos com lealdade quando abandonamos a nossa tarefa, quando não compartilhamos com os outros o empenho e a abnegação no cumprimento dos compromissos profissionais ou quando nos possam classificar como inconstantes, inconvenientes, frívolos, desordenados, preguiçosos e inúteis… Na verdade, quem descuida essas obrigações aparentemente menos importantes, só com dificuldade vencerá nas da vida interior que, certamente, são mais custosas. Quem é fiel nas coisas pequenas, é fiel também nas grandes; e quem é injusto nas pequenas coisas, é injusto também nas grandes.

Não estou a falar de ideais imaginários. Atenho-me a uma realidade muito concreta, de capital importância, capaz de modificar o ambiente mais pagão e mais hostil às exigências divinas, como aconteceu na primeira época da era da nossa salvação. Saboreai estas palavras de um autor anónimo desses tempos, o qual resume assim a grandeza da nossa vocação: os cristãos são para o mundo o que a alma é para o corpo. Vivem no mundo, mas não são mundanos, tal como a alma está no corpo, mas não é corpórea. Habitam em todos os povoados, como a alma está em todas as partes do corpo. Agem mediante a sua vida interior sem se fazerem notar, como a alma mediante a sua essência… Vivem como peregrinos entre coisas perecedoiras, na esperança da incorruptibilidade dos céus, como a alma imortal vive agora numa tenda mortal. Multiplicam-se dia-a-dia sob o peso das perseguições, como a alma se aformoseia pela mortificação… E não é lícito aos cristãos abandonarem a sua missão no mundo, como não é permitido à alma separar-se voluntariamente do corpo.

Por esta razão, enganar-nos-íamos no caminho, se não déssemos importância às ocupações temporais. Também aí vos espera o Senhor. Podeis ter a certeza de que nós, homens, nos havemos de aproximar de Deus através das circunstâncias da vida corrente, ordenadas ou permitidas pela Providência na sua sabedoria infinita. Não atingiremos esse fim, se não nos esforçarmos por terminar bem a nossa tarefa; se não perseverarmos no afã pelo trabalho começado com empenho humano e sobrenatural; se não desempenharmos bem o nosso ofício como o melhor e, se é possível - e penso que, se tu verdadeiramente quiseres, assim será - melhor do que o melhor, porque usaremos todos os meios terrenos honrados e os espirituais que forem necessários para oferecer a Nosso Senhor um trabalho primoroso, acabado como uma peça de filigrana, perfeito.

Possumus!. Podemos vencer também esta batalha com a ajuda do Senhor. Convencei-vos de que não se torna difícil converter o trabalho num diálogo de oração. Basta oferecê-lo a Deus e meter mãos à obra, pois Ele já nos está a ouvir e a alentar. Assim, nós, no meio do trabalho quotidiano, conquistamos o modo de ser das almas contemplativas, porque nos invade a certeza de que Deus nos olha, sempre que nos pede uma nova e pequena vitória: um pequeno sacrifício, um sorriso à pessoa importuna, começar pela tarefa menos agradável e mais urgente, ter cuidado com os pormenores de ordem, ser perseverante no dever quando era tão fácil abandoná-lo, não deixar para amanhã o que temos de terminar hoje… E tudo isto para dar gosto ao Nosso Pai Deus! Entretanto, talvez sobre a tua mesa ou num lugar discreto que não chame a atenção, para te servir de despertador do espírito contemplativo, pões o crucifixo, que já se tornou para a tua alma e para a tua mente o manual onde aprendes as lições de serviço.

Se te decidires - sem fazer coisas esquisitas, sem abandonar o mundo, no meio das tuas ocupações habituais - a entrar por estes caminhos de contemplação, sentir-te-ás imediatamente amigo do Mestre e com o encargo divino de abrir os caminhos divinos da terra a toda a humanidade. Sim, com esse teu trabalho contribuirás para que se estenda o reinado de Cristo em todos os continentes e seguir-se-ão, uma atrás da outra, as horas de trabalho oferecidas pelas longínquas nações que nascem para a fé, pelos povos do leste barbaramente impedidos de professar com liberdade as suas crenças, pelos países de antiga tradição cristã onde parece que se obscureceu a luz do Evangelho e as almas se debatem nas sombras da ignorância… Que valor adquire então essa hora de trabalho, esse continuar com o mesmo empenho durante um pouco mais de tempo, alguns minutos mais, até rematar a tarefa. Convertes assim, de um modo prático e simples, a contemplação em apostolado, como necessidade imperiosa do coração, que pulsa em uníssono com o dulcíssimo e misericordioso Coração de Jesus, Nosso Senhor.

Apostolado na vida corrente

Vejamos agora aquela outra pesca que se deu depois da Paixão e Morte de Jesus Cristo. Pedro negou três vezes o Mestre e chorou de pena humildemente. O galo, com o seu canto, recordou-lhe as advertências do Senhor e ele pediu perdão do fundo da alma. Enquanto espera, contrito, na promessa da Ressurreição, exerce o seu ofício e vai pescar. A propósito desta pesca, pergunta-se com frequência por que é que Pedro e os filhos de Zebedeu voltaram à ocupação que tinham antes de o Senhor os chamar. Efectivamente eram pescadores quando o Senhor lhes disse: Segui-me e Eu vos farei pescadores de homens. Aos que se surpreendem com esta conduta deve-se responder que não estava proibido aos Apóstolos exercer a sua profissão, visto que se tratava de coisa legítima e honesta.

O apostolado, essa ânsia que vibra no íntimo do cristão, não é coisa separada da vida de todos os dias; confunde-se com o próprio trabalho, convertido em ocasião de encontro pessoal com Cristo. Nesse trabalho, ombro a ombro com os nossos colegas, com os nossos amigos, com os nossos parentes, lutando pelos mesmos interesses, podemos ajudá-los a chegar a Cristo, que nos espera na margem do lago… Antes de ser apóstolo, pescador. Também, pescador depois de ser apóstolo. Antes e depois, a mesma profissão.

Que mudança há então? Há mudança na alma, porque nela entrou Cristo, tal como entrou na barca de Pedro. Abrem-se amplos horizontes, maior ambição de servir e um desejo irreprimível de anunciar a todas as criaturas as magnalia Dei, as coisas maravilhosas que o Senhor faz, se lho permitimos. Aqui não posso deixar de recordar que o trabalho, digamos profissional dos sacerdotes é um ministério divino e público, que abarca exigentemente toda a sua vida. Pode-se dizer até, de um modo geral, que se a um sacerdote lhe sobra tempo para trabalhos que não sejam propriamente sacerdotais, é certo que não cumpre os deveres do seu ministério.

Estavam juntos Simão Pedro, Tomé, chamado Dídimo, Natanael, que era de Caná da Galileia, os filhos de Zebedeu, e outros dois dos seus discípulos. Disse-lhes Simão Pedro: Vou pescar. Responderam-lhe: Também nós vamos contigo. Foram, pois, e entraram numa barca. Naquela noite nada apanharam. Chegada a manhã, Jesus apresentou-se na praia.

Passa ao lado dos seus Apóstolos, junto daquelas almas que se lhe entregaram… E eles não se dão conta disso! Quantas vezes está Cristo, não perto de nós, mas dentro de nós, e temos uma vida tão humana! Cristo está ao nosso lado e não recebe um olhar de carinho, uma palavra de amor, uma obra de serviço por parte dos seus filhos!

Além disso, quem disse que para falar de Cristo, para difundir a sua doutrina, era preciso fazer coisas especiais, fora do comum? Faz a tua vida normal; trabalha onde estás a trabalhar, procurando cumprir os deveres do teu estado, acabar bem o que é próprio da tua profissão ou do teu ofício, superando-te, melhorando-te dia-a-dia. Sê leal, compreensivo com os outros e exigente contigo mesmo. Sê mortificado e alegre. Será esse o teu apostolado. E, sem saberes porquê, tendo perfeita consciência das tuas misérias, os que te rodeiam virão ter contigo e, numa conversa natural, simples - à saída do trabalho, numa reunião familiar, no autocarro, ao dar um passeio, em qualquer parte - falareis de inquietações que em todas as almas existem, embora às vezes alguns não queiram dar por isso. Mas cada vez as perceberão melhor, desde que comecem a procurar Deus a sério.

Pede a Maria, Regina apostolorum, que te decidas a participar nas ânsias de sementeira e de pesca que estão no Coração do seu Filho. Garanto-te que, se começares, terás a barca cheia, como os pescadores da Galileia. E Cristo na margem, à tua espera. Porque a pesca é sua.

Referências da Sagrada Escritura
Referências da Sagrada Escritura