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Há 3 pontos em «Cristo que Passa» cujo tema é Virtudes humanas  → alegria.

Quando chega o Natal, gosto de contemplar as imagens do Menino Jesus. Essas figuras que nos mostram o Senhor tão apoucado, recordam-me que Deus nos chama, que o Omnipotente Se quis apresentar desvalido, quis necessitar dos homens. Do berço de Belém, Cristo diz-me a mim e diz-te a ti que precisa de nós; reclama de nós uma vida cristã sem hesitações, uma vida de entrega, de trabalho, de alegria.

Não conseguiremos jamais o verdadeiro bom humor se não emitarmos deveras Jesus, se não formos humildes como Ele. Insistirei de novo: vedes onde se oculta a grandeza de Deus? Num presépio, nuns paninhos, numa gruta. A eficácia redentora das nossas vidas só se pode dar com humildade, deixando de pensar em nós mesmos e sentindo a responsabilidade de ajudar os outros.

É corrente, às vezes até entre almas boas, criar conflitos íntimos, que chegam a produzir sérias preocupações, mas que carecem de qualquer base objectiva. A sua origem está na falta de conhecimento próprio, que conduz à soberba: o desejo de se tornarem o centro da atenção e da estima de todos, a preocupação de não ficarem mal, de não se resignarem a fazer o bem e desaparecerem, a ânsia da segurança pessoal… E assim, muitas almas que poderiam gozar de uma paz extraordinária, que poderiam saborear um imenso júbilo, por orgulho e presunção tornam-se desgraçadas e infecundas!

Cristo foi humilde de coração. Ao longo da sua vida, não quis para Si nenhuma coisa especial, nenhum privilégio. Começa por estar nove meses no seio de sua Mãe, como qualquer outro homem, com extrema naturalidade. Sabia o Senhor de sobra que a Humanidade padecia de uma urgente necessidade d'Ele. Tinha, portanto, fome de vir à terra para salvar todas as almas; mas não precipita o tempo; vem na Sua hora, como chegam ao mundo os outros homens. Desde a concepção ao nascimento, ninguém, salvo S. José e Santa Isabel, adverte esta maravilha: Deus veio habitar entre os homens!

O Natal também está rodeado de uma simplicidade admirável: o Senhor vem sem aparato, desconhecido de todos. Na Terra, só Maria e José participam na divina aventura. Depois, os pastores, avisados pelos Anjos. E mais tarde os sábios do Oriente. Assim acontece o facto transcendente que une o Céu à Terra, Deus ao homem!

Como é possível tanta dureza de coração que cheguemos a acostumar-nos a estes episódios? Deus humilha-Se para que possamos aproximar-nos d'Ele, para que possamos corresponder ao seu Amor com o nosso amor, para que a nossa liberdade se renda, não só ante o espectáculo do seu poder, como também ante a maravilha da sua humildade.

Grandeza de um Menino que é Deus! O Seu Pai é o Deus que fez os Céus e a Terra, e Ele ali está, num presépio, quia non erat eis locus in diversorio, porque não havia outro sítio na Terra para o dono de toda a Criação!

Ouro, incenso e mirra

Videntes autem stellam, gavisi sunt gaudio magno valde” - diz o texto latino com admirável reiteração: ao descobrir novamente a estrela, exultaram com grande alegria. E porquê tanta alegria? Porque eles, que nunca duvidaram, recebem do Senhor a prova de que a estrela não tinha desaparecido; deixaram de a ver sensivelmente mas tinham-na conservado sempre na alma. Assim é a vocação cristã: se não se perde a fé, se se mantém a esperança em Jesus Cristo que estará connosco até à consumação dos séculos, a estrela reaparece. E, ao verificar uma vez mais a realidade da vocação, nasce em nós uma alegria maior, que aumenta a nossa fé, a nossa esperança, o nosso amor.

Ao entrarem na casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe, e, pondo-se de joelhos, adoraram-no. Ajoelhemo-nos nós também diante de Jesus, do Deus escondido na humanidade; repitamos-lhe que não queremos voltar as costas ao seu chamamento divino, que nunca nos afastaremos dele; que arredaremos do nosso caminho tudo o que for um estorvo para a fidelidade; que desejamos sinceramente ser dóceis às suas inspirações. Tu, interiormente, e eu também - porque estou a fazer uma oração íntima, com um profundo clamor silencioso - dizemos agora ao Menino que ansiamos por ser tão cumpridores como os servos da parábola, para que também nos possa responder a nós: alegra-te servo bom o fiel.

E, abrindo os seus tesouros, ofereceram-lhe presentes de ouro, incenso e mirra. Detenhamo-nos um pouco para entender este passo do Santo Evangelho. Como é possível que nós, que nada somos e nada valemos, ofereçamos alguma coisa a Deus? Diz a Escritura: toda a dádiva e todo o dom perfeito vem do alto. O homem não consegue descobrir plenamente a profundidade e a beleza dos dons do Senhor: se tu conhecesses o dom de Deus… - responde Jesus à mulher samaritana. Jesus Cristo ensinou-nos a esperar tudo do Pai, a procurar antes de mais o Reino de Deus e a sua justiça, porque tudo o resto se nos dará por acréscimo e Ele conhece bem as nossas necessidades. Na economia da salvação, o nosso Pai cuida de cada alma com amor e delicadeza: cada um recebeu de Deus o seu próprio dom; uns de um modo, outros de outro. Portanto, podia parecer inútil cansarmo-nos, tentando apresentar ao Senhor algo de que Ele precise; dada a nossa situação de devedores que não têm com que saldar as dívidas, as nossas ofertas assemelhar-se-iam às da Antiga Lei, que Deus já não aceita: Tu não quiseste os sacrifícios, as oblações e os holocaustos pelo pecado, nem te são agradáveis as coisas que se oferecem segundo a Lei.

Mas o Senhor sabe que o dar é próprio dos apaixonados e Ele próprio nos diz o que deseja de nós. Não lhe interessam riquezas, nem frutos, nem animais da terra, do mar ou do ar, porque tudo isso lhe pertence. Quer algo de íntimo, que havemos de lhe entregar com liberdade: dá-me, meu filho, o teu coração. Vedes? Se compartilha, não fica satisfeito: quer tudo para si. Repito: não pretende o que é nosso; quer-nos a nós mesmos. Daí - e só daí - advêm todas as outras ofertas que podemos fazer ao Senhor.

Demos-lhe, portanto, ouro: o ouro fino do espírito de desprendimento do dinheiro e dos bens materiais. Não esqueçamos que são coisas boas, que vêm de Deus. Mas o Senhor dispôs que as utilizemos sem deixar que o coração fique preso a elas, pelo contrário, tirando delas proveito para bem da humanidade.

Os bens da terra não são maus; pervertem-se quando o homem os toma como ídolos e se prostra diante deles; mas tornam-se nobres quando os tornamos instrumentos para o bem nalguma actividade cristã de justiça e de caridade. Não podemos correr atrás dos bens económicos, como quem procura um tesouro; o nosso tesouro está aqui, deitado num presépio; é Cristo e nele se há-de concentrar todo o nosso amor, porque onde está o teu tesouro, aí está também o teu coração.

A alegria é um bem cristão. Só desaparece com a ofensa a Deus, porque o pecado é fruto do egoísmo e o egoísmo é a causa da tristeza. Mesmo então, essa alegria permanece no fundo da alma, pois sabemos que Deus e a sua Mãe nunca se esquecem dos homens. Se nos arrependemos no santo sacramento da penitência, Deus vem ao nosso encontro e perdoa-nos. E já não há tristeza. Na verdade, é muito justo que haja regozijo, porque o teu irmão estava morto e ressuscitou; tinha-se perdido e foi encontrado.

Estas palavras são o final maravilhoso da parábola do filho pródigo, que jamais nos cansaremos de meditar: eis que o Pai vem ao teu encontro; inclinar-se-á sobre o teu ombro e dar-te-á um beijo, penhor de amor e de ternura; fará que te entreguem um vestido, um anel, o calçado. Tu receias ainda uma repreensão, e ele devolve-te a tua dignidade; temes um castigo, e dá-te um beijo; tens medo duma palavra irada, e prepara para ti um banquete.

O amor de Deus é insondável. Se procede assim com quem O ofendeu, o que não fará para honrar a sua Mãe, imaculada, Virgo fidelis, Virgem Santíssima, sempre fiel?

Se o amor de Deus se manifesta tão grande quando o acolhimento que lhe dá o coração humano - tantas vezes traidor - é tão pouco, como não será no coração de Maria, que nunca levantou o mínimo obstáculo à vontade de Deus?

Vede como a liturgia da festa faz eco da impossibilidade de compreender a misericórdia infinita do Senhor com raciocínios humanos; mais do que explicar, canta; fere a imaginação, a fim de que todos se entusiasmem no louvor, pois ficaremos sempre muito aquém do que é merecido: apareceu no céu um grande sinal. Uma mulher vestida de sol, e a lua debaixo de seus pés, e uma coroa de doze estrelas sobre a sua cabeça. E o rei cobiçará a tua beleza. A filha do rei entra toda formosa; tecidos de ouro são os seus vestidos.

A liturgia acabará com algumas palavras de Maria, nas quais a maior humildade se conjuga com a maior glória: eis que, de hoje em diante, todas as gerações me chamarão bem aventurada, porque fez em mim grandes coisas aquele que é todo poderoso.

Cor Mariae Dulcissimum, iter para tutum: Coração Dulcíssimo de Maria, dá força e segurança ao nosso caminho na Terra. Sê tu mesma o nosso caminho, porque tu conheces as vias e os atalhos certos que, através do teu amor, levam ao amor de Jesus Cristo.