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Há 3 pontos em «Entrevistas a S. Josemaria» cujo tema é Caridade → sacrifício.

Há casais em que a mulher - por qualquer razão - se encontra separada do marido, em situações degradantes e insustentáveis. Nesses casos, torna-se-lhes difícil aceitar a indissolubilidade do vínculo matrimonial. Estas mulheres separadas do marido lamentam que se lhes negue a possibilidade de construir um novo lar. Que resposta daria a estas situações?

Diria a essas mulheres, compreendendo o seu sofrimento, que também podem ver nessa situação a Vontade de Deus, que nunca é cruel, porque Deus é Pai amoroso. É possível que por algum tempo a situação seja especialmente difícil, mas, se recorrerem ao Senhor e à sua Santa Mãe, não lhes faltará a ajuda da graça.

A indissolubilidade do matrimónio não e um capricho da Igreja e nem sequer uma mera lei positiva eclesiástica. É de lei natural, de direito divino, e corresponde perfeitamente à nossa natureza e à ordem sobrenatural da graça. Por isso, na imensa maioria dos casos, é condição indispensável de felicidade dos cônjuges, e de segurança, mesmo espiritual, para os filhos. E sempre - ainda nesses casos dolorosos de que falámos - a aceitação rendida da vontade de Deus traz consigo uma profunda satisfação, que nada pode substituir. Não é um recurso, não é uma simples consolação, é a essência da vida cristã.

Se essas mulheres já têm filhos a seu cargo, hão-de ver nisso uma exigência contínua de entrega amorosa, maternal, então especialmente necessária para suprir nessas almas as deficiências de um lar dividido. E hão-de entender generosamente que essa indissolubilidade, que para elas implica sacrifício, é para a maior parte das famílias uma defesa da sua integridade, algo que enobrece o amor dos esposos e impede o desamparo dos filhos.

Este assombro em face da aparente dureza do preceito cristão da indissolubilidade não é novo. Os Apóstolos estranharam quando Jesus o confirmou. Pode parecer uma carga, um jugo; mas o próprio Cristo disse que o seu jugo é suave e a sua carga leve.

Por outro lado, reconhecendo embora a inevitável dureza de bastantes situações - as quais, em não poucos casos, se poderiam e deveriam ter evitado -, é necessário não dramatizar demasiado. A vida de uma mulher nessas condições será realmente mais dura que a de outra mulher maltratada, ou que a vida de quem padece algum dos outros grandes sofrimentos físicos ou morais que a existência traz consigo?

O que verdadeiramente torna uma pessoa infeliz - e até uma sociedade inteira - é essa busca ansiosa de bem-estar, o cuidado de eliminar, seja como for, tudo o que nos contrariar. A vida apresenta mil facetas, situações diversíssimas, umas árduas, outras, talvez só na aparência, fáceis. A cada uma delas corresponde a sua própria graça; cada uma é uma chamada original de Deus, uma ocasião inédita de trabalhar, de dar o testemunho divino da caridade. A quem sentir a angústia de uma situação difícil, eu aconselharia que procurasse também esquecer-se um pouco dos seus próprios problemas para se preocupar com os problemas dos outros. Fazendo isto, terá mais paz e, sobretudo, santificar-se-á.

Mas nem tudo depende dos pais. Os filhos têm de pôr também alguma coisa da sua parte. A juventude sempre teve uma grande capacidade de entusiasmo por todas as coisas grandes, pelos ideais elevados, por tudo o que é autêntico. Convém ajudá-los a compreender a beleza despretensiosa - por vezes calada e sempre revestida de naturalidade - que há na vida dos seus pais. Que reparem, sem lhes causar tristeza, no sacrifício que fizeram por eles, na sua abnegação - muitas vezes heróica - para manter a família. E que os filhos aprendam também a não dramatizar, a não representar o papel de incompreendido. Que não esqueçam que estarão sempre em dívida para com os pais e que o modo de corresponderem - já que não podem pagar o que devem - deve ser feito de veneração, de carinho grato, filial.

Sejamos sinceros: a família unida é o normal. Há atritos, diferenças… Mas isto são coisas banais, que, até certo ponto, contribuem inclusivamente para dar sabor aos nossos dias. São insignificâncias que o tempo supera sempre. Depois, só fica o estável, que é o amor, um amor verdadeiro - feito de sacrifício - e nunca fingido, que os leva a preocuparem-se uns com os outros, a adivinhar um pequeno problema e a sua solução mais delicada. E, porque tudo isto é normal, a maior parte das pessoas entendeu-me muito bem quando me ouviu chamar - já o venho repetindo desde a década de 20 - dulcíssimo preceito ao quarto mandamento do Decálogo.

Sacrifício: eis aí, em grande parte, a realidade da pobreza. Pobreza é saber prescindir do supérfluo, medido não tanto por regras teóricas como segundo essa voz interior que nos adverte de que se está infiltrando o egoísmo ou a comodidade desnecessária. Conforto, em sentido positivo, não é luxo nem voluptuosidade, mas tornar a vida agradável à própria família e aos outros, para que todos possam servir melhor a Deus.

Pobreza é o verdadeiro desprendimento das coisas terrenas, é levar com alegria as incomodidades, se as há, ou a falta de meios. É, além, disso, saber ter todo o dia tomado com um horário elástico no qual não falte como tempo principal - além das normas diárias de piedade - o devido descanso, a reunião familiar, a leitura, o tempo dedicado a um gosto artístico, à leitura ou a outra distracção nobre, enchendo as horas com uma actividade útil, fazendo as coisas o melhor possível, vivendo os pormenores de ordem, de pontualidade, de bom humor. Numa palavra, encontrando ocasião para o serviço dos outros e para si mesmo, sem esquecer que todos os homens, todas as mulheres, - e não só os materialmente pobres - têm obrigação de trabalhar. A riqueza, a situação de desafogo económico é um sinal de que se tem mais obrigação de sentir a responsabilidade pela sociedade inteira.

O amor é que dá sentido ao sacrifício. Toda a mãe sabe bem o que é sacrificar-se pelos seus filhos. O sacrifício não está só em conceder-lhes umas horas, mas em gastar toda a vida em seu benefício. Viver pensando nos outros, usar as coisas de tal maneira que haja algo para oferecer aos outros, tudo isso são dimensões da pobreza que garantem o desprendimento efectivo.

Para uma mãe, é importante não só viver assim, como também ensinar os filhos a viverem assim: educá-los, fomentando neles a fé, a esperança optimista e a caridade; ensiná-los a superar o egoísmo e a empregar com generosidade parte do seu tempo ao serviço dos menos afortunados, participando em ocupações adequadas à sua idade, nas quais se manifeste um anseio de solidariedade humana e divina.

Resumindo: que cada um viva cumprindo a sua vocação. Para mim, foram sempre o melhor exemplo de pobreza esses pais e essas mães de família numerosa e pobre que se sacrificam pelos seus filhos e que, com o seu esforço e constância - muitas vezes sem uma palavra para dizer a alguém que passam necessidades - mantêm os seus, criando um lar alegre em que todos aprendem a amar, a servir, a trabalhar.

Referências da Sagrada Escritura
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